por Paulo Metri
O povo não sabe nada sobre Libra
e, se depender da mídia comercial, continuará inocente para sempre. Sugiro uma
enquete feita por um instituto de pesquisa confiável, com uma única pergunta à
população: “O que você acha do leilão de Libra, que vai ocorrer em 21 de
outubro próximo?”. Aposto que, no mínimo, 95% dos entrevistados não saberão o
que é Libra. No entanto, o leilão de oito a doze bilhões de barris de petróleo,
que se convencionou chamar de campo de Libra, não poderia passar despercebido.
Está em jogo a possibilidade de muito mais recursos estarem disponíveis, no
futuro, para educação, saúde, habitação, saneamento e outros programas sociais,
se este campo for bem aproveitado. Se for leiloado, a maior parte destes
recursos irá para as petrolíferas estrangeiras.
Este importante fato não é
divulgado, simplesmente, porque a mídia comercial existente é subordinada aos
interesses do capital e, neste assunto, as petrolíferas estrangeiras determinam
que a sociedade deve permanecer em total ignorância. Desta forma, informações
confiáveis, hoje, só na mídia alternativa. O que será desviado da sociedade com
o leilão de Libra corresponde à maior apropriação de um patrimônio público
desde a nossa independência. Só não digo desde a descoberta do país, porque não
sei quanto ouro foi levado das nossas terras para Portugal.
A totalidade do petróleo de Libra
vale, no mínimo, US$ 1 trilhão, mas, provavelmente, chegará a US$ 1,5 trilhão.
Nem tudo será desviado, pois existem o Fundo Social e os royalties. Mas poderia
retornar mais para a sociedade, se Libra fosse entregue sem licitação à
Petrobras, que assinaria um contrato de partilha com a União, satisfazendo o
artigo 12 da lei 12.351, e com a máxima contribuição para o Fundo Social.
Qualquer valor abaixo deste máximo que a Petrobras pode entregar deve ser
considerado como um desvio de patrimônio da nossa sociedade.
Assim, o desvio de Libra, se o
governo teimar em leiloá-lo para as empresas estrangeiras, será maior que a
transferência de todo manganês da Serra do Navio no Amapá para formar uma
montanha em outro país. Será maior que o roubo da privatização da Vale, que
chegou a US$ 100 bilhões, ou o das teles, que dizem ter sido em torno de US$ 40
bilhões. Se for tomado o desvio ou o caixa 2 dos chamados mensaleiros, da ordem
de uma ou duas centenas de milhões de reais, o leilão de Libra significa uma
subtração de recursos da ordem de 10.000 vezes maior que o tão divulgado rombo
do “mensalão”.
Contudo, no caso de Libra, temos
o desvio institucionalizado, uma vez que o leilão não é a melhor aplicação da
lei 12.351, mas ele também está previsto nesta lei. Se o argumento de que o
leilão não traz o melhor impacto para a sociedade for levado a um juiz, ele
poderá indeferir o pedido de sustação do leilão, alegando que este é previsto
em lei e, se a lei é injusta, não cabe a ele, juiz, modificá-la. Aliás, todas
as 11 rodadas de leilões da ANP já ocorridas, seguindo a lei 9.478, excetuando
a oitava, tiveram respaldo legal. O Congresso Nacional, tão comprometido com o
poder econômico quanto a mídia, só irá reverter esta lei se houver grande
pressão popular ou se a população passar a votar melhor, inclusive se deixar de
votar contra si própria.
Para descrever a apropriação
indevida, há uma correspondência clara entre este ciclo do ouro negro com o que
aconteceu no ciclo do ouro passado, pois a Coroa são os atuais países-sede das
petrolíferas estrangeiras, a Colônia é a mesma; a administração da Coroa na Colônia
é, hoje, o atual governo brasileiro; os agentes da usurpação são, ontem e hoje,
os estrangeiros; e os usurpados de hoje são os descendentes dos usurpados do
ciclo passado.
Fatidicamente, ficamos sempre com
pouco usufruto sobre a riqueza que nos entrega a natureza ou o Criador.
Espoliado desde a invasão europeia de 1500, o Brasil está no grupo das nações
supridoras de grãos e minérios para os opulentos, que têm tecnologia,
indústrias e serviços com alto conteúdo tecnológico e forças armadas persuasivas
e opressoras.
Não há risco em Libra, pois não
há dúvida sobre a existência deste petróleo. Não há pressa, a menos que o
governo esteja com dificuldade para fechar suas contas, inclusive, o superávit
primário. Mas, se este for o caso, lembre-se que se estão comprometendo
realizações futuras durante muitos anos por uma questão conjuntural. Se a
Petrobras estiver com sua capacidade de envolvimento em novos negócios
esgotada, pode-se esperar, pois o abastecimento do país está garantido graças a
ela própria por, no mínimo, uns 40 anos.
Aproveito para salientar que
nenhuma empresa estrangeira se dispõe a abastecer o país, a construir
refinarias, contratar plataformas e outros bens aqui. Querem unicamente o
petróleo e seu lucro, em exploração completamente desvinculada da população que
habita a região. Minha esperança, hoje, são os sindicalistas, os filiados a
entidades de classe, os integrantes de movimentos sociais, os jovens que estão
na rua, os internautas do bem, os perceptivos e honestos da mídia alternativa e
o ex-presidente Sarney, a quem passo a fazer um pedido de público, já que não
tenho canais de interlocução.
Vossa Excelência, durante sua
vida pública, deu claras demonstrações de compreender a importância de se
preservar a soberania do país e que esta posição nacionalista era necessária
para se conseguirem avanços progressistas, tendo o seu governo se norteado por
estes princípios. De memória, cito algumas medidas soberanas e progressistas do
governo de Vossa Excelência: criação do Mercosul; determinação do domínio
completo da tecnologia do Ciclo do Combustível Nuclear; decisão da construção
do submarino nuclear; acordo com a China para o lançamento conjunto de
satélite; moratória da Dívida Externa; lançamento do Plano Cruzado com o controle
dos preços; reatamento com Cuba; criação do Ministério da Reforma Agrária;
criação do Ministério da Cultura, com a nomeação do economista Celso Furtado
para exercer o cargo de ministro; legalização de todos os partidos antes
clandestinos e reconhecimento das centrais sindicais; nomeação de um
nacionalista como Renato Archer para o Ministério da Ciência e Tecnologia;
defesa da Causa Palestina e da Nicarágua Sandinista nos fóruns internacionais;
defesa na ONU da autodeterminação e independência do Timor Leste; e reserva de
mercado da informática, com a criação da Secretaria Especial de Informática,
reserva esta mal interpretada até hoje.
Assim, peço a Vossa Excelência,
político respeitado e de muitos aliados, que tem a sensibilidade necessária
para compreender os argumentos de soberania, que é imprescindível para o
progresso social colocar todo o seu peso político adquirido, em anos de atuação
no nosso cenário, para que o leilão de Libra seja suspenso e este campo seja
entregue à Petrobras, sem licitação prévia, através de contrato de partilha,
como permite a lei 12.351. O povo brasileiro, no dia que ganhar consciência
plena, será muito agradecido a Vossa Excelência.
Paulo Metri é conselheiro do
Clube de Engenharia
Fonte: correio da cidadania
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