Na opinião de pesquisadores, o que acontece na Venezuela é uma
democracia participativa e não uma ditadura. Nas próximas eleições, em outubro,
estarão em disputa dois modelos vigentes na América Latina.
“Ditador”, “caudilho” e “populista” são alguns
dos adjetivos utilizados por parte da mídia venezuelana para desqualificar o
presidente venezuelano Hugo Chávez. Mas, após vencer três eleições
presidenciais e enfrentar 12 pleitos - entre referendos e eleições municipais -
é correto afirmar que existe algum tipo de ditadura comandada por Chávez?
No poder há mais de 13 anos e
candidato à reeleição para o pleito do próximo dia 7 de outubro, Chávez é fruto
da crise e da contradição em que vivia a sociedade venezuelana nos anos 80 e
90. A riqueza proveniente do petróleo
estava concentrada nas mãos de poucos, enquanto a maioria da população vivia em
extrema pobreza.
Ao fortalecer o Estado e destinar
os recursos do petróleo para programas sociais e melhoria de vida da população,
Chávez diminuiu a pobreza extrema em 50% e transformou a Venezuela no país com
o menor índice de desigualdade social da América Latina, segundo a Comissão
Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).
Ano eleitoral
Neste ano, durante as eleições
presidenciais de outubro, a população venezuelana terá que decidir entre o
atual presidente e o candidato oposicionista Capriles Radonski, acusado de ter
participado da tentativa de golpe de Estado contra Chávez em 2002. Diante desse
quadro, o jornalista e historiador, Gilberto Maringoni, descreve os modelos que
representam os dois candidatos.
“O que o Chávez conseguiu fazer
foi fortalecer o Estado e o desenvolvimento petroleiro para que ele gere
superávit para programas sociais, para reforma agrária e o bem estar da
população. Do lado do Capriles, está em voga o modelo neoliberal clássico, que
é o de abrir o país, abrir a exploração petroleira, tirar peso do Estado e
criar uma situação semelhante a que havia antes de 1990. São modelos que estão
em disputa na América Latina, em cada país com características próprias.”
Maringoni chama atenção para o
fato de que a campanha de Capriles cresceu em cima de debilidades do governo de
Chávez, principalmente as que se referem à administração pública. No entanto,
lembra que, apesar das críticas à reeleição indefinida de Chávez, todas as
pesquisas apontam para um favoritismo do presidente.
“Sobre a reeleição continuada do
Chávez, ele se submeteu a um referendo e a população aprovou isso. Eu não tenho
que julgar se a população quer ou não. O Chávez continua desfrutando de uma
altíssima popularidade e todos os institutos de pesquisas, inclusive os
independentes do governo, atestam que ele deve ganhar as eleições de outubro
agora.”
Construção da democracia
O jornalista compara a situação
da Venezuela com a de outros países, principalmente europeus, que também
reelegem seus representantes indefinidamente.
“A Inglaterra, inclusive, é um
país extremamente atrasado em termos institucionais que as pessoas não falam. É
um país que tem o rei e a rainha. E o primeiro-ministro é uma solução de
compromisso para manter aquele gasto inútil com a nobreza. O Chávez não é uma
rainha, ele pode ser derrotado nas eleições.”
O pesquisador lembra ainda que
não é somente por meio de eleições que se mede a democracia no país.
“Democracia se mede por
participação da população, por bem-estar, por funcionamento livre da produção e
pela imprensa que funciona livremente. E isso acontece na Venezuela, embora
haja uma campanha dizendo que não.”
Um dos principais instrumentos da
democracia venezuelana é o Consejo Comunal (Conselho Comunitário). A mestre em História pela Universidade
Federal Fluminense (UFF), Mariana Bruce, define os Consejos Comunales
(Conselhos Comunitários) como microgovernos construídos no interior das
comunidades locais, compostos e geridos pelos próprios moradores.
“É uma experiência muito
interessante porque a gente está falando do alargamento do Estado para dentro
das comunidades populares. Quer dizer, o exercício do poder político não é
apenas feito pelos representantes e, sim, pelo próprio povo, dentro de uma
dinâmica que envolve não só a participação, mas também o protagonismo das ações
por parte desse povo.”
Segundo o Ministério das Comunas,
hoje existem mais de 31 mil Consejos Comunales que compõem um projeto nacional
de construção de um “Estado Comunitário”.
Constituição
Outro símbolo importante para a
democracia venezuelana é a Constituição, criada em 1999, a partir de uma
Assembleia Constituinte. Segundo Bruce, a Carta representa um esforço do Estado
de reconhecer a história do povo venezuelano que, mesmo antes da eleição de
Chávez, já possuía um alto índice de organização.
“E isso se deve não a um projeto
pronto do presidente, pelo contrário, a grande chave para compreender o governo
Hugo Chávez é que ele abriu espaços para que os movimentos sociais pudessem se
colocar e apresentar seus projetos. E a Constituição é resultado disso, de toda
essa participação. E, é por isso que você tem uma das constituições mais
progressistas da América Latina, quiçá do mundo.”
A Constituição ampliou os
direitos sociais, reconhecendo direitos de indígenas e mulheres e lançou as
bases para a construção da participação popular na política. Para Mariana
Bruce, por esses mecanismos democráticos existentes na Venezuela, não é correto
afirmar que existe uma ditadura nesse país.
“Pela primeira vez, a gente está
falando de uma experiência democrática em um país, em que o povo tem a
possibilidade de se posicionar, de propor e de executar. Não apenas participar,
mas ser protagônico realmente. Então, que ditadura é essa, em que há realmente
essa participação política tanto nas esferas da participação direta, quanto na
própria via representativa?”
Fonte: site
RadioAgencia NP - por
Pilar Rodriguez,
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