Os projetos de integração da
América Latina possibilitam parcerias econômicas, políticas sociais, que
contribuíram para que a região resistisse melhor à crise mundial, como apontam
especialistas.
O peso político e econômico da
Venezuela no cenário internacional é fator a ser analisado com a entrada de
Hugo Chávez na presidência. Principalmente pelo fato da nação venezuelana ter
dado a largada em um processo de transformações políticas na América Latina,
com eleições de governos progressistas em outros países.
Entre eles, considera-se o Brasil
com Luiz Inácio Lula da Silva – seguido por Dilma Rousseff – e a Argentina com
Néstor e Cristina Kirchner, a partir de 2003. Há também Evo Morales na Bolívia,
Rafael Correa no Equador, os mandatos de Tabaré Vázquez e Pepe Mujica no
Uruguai, Daniel Ortega na Nicarágua e Fernando Lugo no Paraguai.
O sociólogo e professor da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Emir Sader, acredita que essas
mudanças indicam uma virada de período político na América Latina. Ele afirma
que a região deixou de ser uma zona de consenso neoliberal, passando a ter uma
integração autônoma em relação aos Estados Unidos.
“Representou, em primeiro lugar,
impedir a possibilidade de um tratado da Área de Livre Comércio das Américas
(ALCA), que era o que os Estados Unidos pretendiam impor no conjunto do
continente. Em segundo lugar, a possibilidade de, alternativamente a isso, ter
um projeto de integração regional, quer dizer, fortalecer o Mercosul, criar a Unasul,
criar o Banco do Sul, criar o Conselho Sul-Americano de Defesa.”
Uma análise similar é
compartilhada pelo especialista em relações internacionais e professor da
Faculdade Cásper Líbero, Igor Fuser.
“Até então, todos os governos da
região seguiam uniformemente uma linha conhecida como Consenso de Washington,
com as políticas neoliberais impostas pelos Estados Unidos e por organismos
internacionais. Aquelas políticas como privatizações, redução dos gastos do
Estado. Prejudicando, sobretudo, setores básicos como saúde, educação,
infraestrutura urbana, moradia.”
Tendo como pano de fundo o
conceito de “Bolivarianismo” em seu governo, Chávez assume os ideais do
libertador Simón Bolívar, um dos líderes da independência das colônias
espanholas no continente. Essa ideia possui dois significados principais: um
sentido interno de emancipação real do povo venezuelano; e outro sentido
internacional, de forte integração latino-americana.
Segundo Igor Fuser, o governo
Chávez implementa na República Bolivariana da Venezuela uma política externa
coerente com sua política interna.
“A política interna da Venezuela
é uma política que inverte as prioridades do Estado. Em vez de priorizar os
interesses das elites, dos setores mais ricos da sociedade, privilegia o povo;
os setores mais pobres, os setores mais carentes, as comunidades de bairro, os
camponeses. No plano da política externa, ocorre uma inversão semelhante.”
Cenário favorável
A perda de poder dos Estados Unidos
sobre a economia mundial, com a ascensão da China no sistema internacional,
proporcionou um cenário favorável para os países latino-americanos. Assim,
essas nações passam a não depender de um único parceiro comercial, como explica
Fuser.
“Hoje as trocas comerciais com a
China têm um papel muito importante para todos os outros países da América
Latina. A China é um parceiro importante da Venezuela, com muitos projetos de
cooperação na área do petróleo e em várias outras áreas também. A Rússia também
é um país que tem ótimas relações com a Venezuela. Graças à Rússia, a Venezuela
não depende mais da tecnologia militar dos Estados Unidos. Mas também países
árabes e do Oriente Médio, como o Irã. O esforço da Venezuela é procurar
diversificar suas relações com o mundo inteiro, em primeiro lugar com a América
Latina.”
O contexto econômico de
crescimento do início da última década, com elevação do preço dos recursos
naturais e agrícolas para exportação, fez com que muitos países da região
acumulassem recursos financeiros, que puderam ser reinvestidos em políticas
sociais.
No caso da Venezuela, que tem
como principal mercadoria o petróleo, o excedente econômico também possibilitou
um investimento em projetos de melhoria das condições de vida em outros países.
Isso é o que observa o pesquisador da Missão do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) na Venezuela, Luiz Fernando Sanná Pinto.
“Boa parte dos acordos da Alba e
da Petrocaribe – que é uma estrutura importante dentro da própria Alba –, assim
como o Acordo de Cooperação Energética de Caracas, vão prever que o que é
economizado por parte dos países que fazem parte, em termos de importação de
petróleo da Venezuela, seja usado em determinados tipos de políticas públicas.
E isso acaba alterando completamente a correlação de forças dentro desses
países. Por isso, que o debate, também, sobre essas novas alianças
internacionais é absolutamente fundamental na política local.”
Projetos de integração
Entre os projetos de integração,
está a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA), criada em
2004, a partir de um acordo entre os governos venezuelano e cubano. Atualmente,
a ALBA é formada por Venezuela, Equador, Bolívia, Nicarágua, Cuba, Antígua e
Barbuda, São Vicente e Granadinas, e Dominica. Sua proposta é ser uma
plataforma de cooperação entre os países da América Latina e do Caribe, para
além do sentido comercial, o que o distingue de acordos regionais como o
Mercado Comum do Sul (Mercosul), como explica Sanná Pinto.
“A Alba é mais como um guarda-chuva
de vários acordos multilaterais e bilaterais de cooperação. Dentro da concepção
desses acordos de cooperação existe uma ideia integracionista. Não tem um viés
comercialista, que em geral a maior parte das instituições relacionadas ou que
tenham alguma relação com a ideia de integração econômica têm.”
Há também uma moeda fictícia
regional chamada Sucre, implementada em 2010, que é um sistema de compensação
do comércio multilateral na região. Isso gerou um impacto de crescimento no
comércio intrabloco, por exemplo, as trocas comerciais entre Venezuela e Equador
aumentaram mais de oito vezes, informa o pesquisador do Ipea. Ele acrescenta
que há também uma busca por complementaridade econômica.
Diante do quadro de maior
integração, também comercial, que inclui o Mercosul, Emir Sader aponta que os
países latino-americanos foram capazes de resistir melhor aos efeitos da crise
econômica internacional.
“Nós pudemos resistir melhor à
crise por essa possibilidade de ter mercados regionais no processo de
integração. Dependemos menos da demanda de países como os Estados Unidos e da
economia europeia”.
Além da Alba e do Mercosul, há
ainda a União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e a Comunidade dos Estados
Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), como importantes iniciativas de
integração regional.
Fonte: Radioagencia NP- por Vivian Fernandes,
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