por Raúl Capote
Raul Capote. Raúl Capote é
cubano. Mas não um cubano qualquer. Na sua juventude foi cooptado pela Agência
Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos. Ofereceram-lhe uma quantidade
sem limite de dinheiro para conspirar contra Cuba. Mas surgiu algo inesperado
para os EUA. Capote, na realidade trabalhava para a segurança nacional cubana.
Desde então, actuou como um agente duplo. Conheça a sua história através de uma
entrevista exclusiva com Chávez Vive, que concedeu em Havana.
"EU ERA O LÍDER DE UM MOVIMENTO
ESTUDANTIL E A CIA CAPTOU-ME"
Como foi o seu processo de
recrutamento ?
Foi um processo de muitos anos,
de vários de anos de preparação e de cooptação. Eu era o líder de um movimento
de juventude em Cuba que, na época, deu origem a uma organização, a Associação
Cultural de Hermanos Saiz, uma associação de jovens criadores, jovens pintores,
escritores, artistas. Eu trabalhava numa cidade do sul de Cuba, centro-sul de
Cuba, Cienfuegos, cujas características, para o inimigo, eram muito
interessantes, porque era uma cidade onde na época se estava construindo um
grande centro industrial. Estava-se construindo uma central eléctrica, a única
que se ia instalar em Cuba e havia muitos jovens a trabalhar na obra. Uma
cidade com muitos jovens engenheiros formados na União Soviética. Estamos
falando do final dos anos oitenta, quando houve todo aquele processo da
perestroika. Muitos engenheiros cubanos, que chegaram a Cuba naquela época,
graduados lá, eram pessoas que vinham com a ideia de perestroika. Portanto, era
um território interessante, onde havia muita gente jovem. E o facto de eu ser
um jovem líder de uma organização cultural, que movimentava um sector
importante dos engenheiros que estavam interessados nas artes, foi interessante
para os americanos que começaram a frequentar as reuniões a que nós
assistíamos. Nunca se identificando como inimigos, nem como agentes da CIA.
Eram vários ou sempre a mesma
pessoa?
Vários. Nunca se apresentavam
como agentes da CIA nem como pessoas que viessem para prejudicar.
- E quem vocês supunham que
fossem?
Apresentavam-se como pessoas que
vinham nos ajudar no nosso projecto, e que tinham a possibilidade de
financiá-lo. Que tinham a capacidade de o tornar realidade. A proposta, como
tal, parecia interessante porque, bem, um projecto no mundo da literatura exige
que se conheça um editor, que se tenham relações editoriais. É um mercado muito
complexo. E vinham em nome de editoras. O que acontecia é que durante o
processo de contacto connosco, parecia bastante claro o que eles realmente
queriam. Porque, uma vez que faziam o contacto, uma vez que começavam a
frequentar as nossas reuniões, que começavam a prometer os financiamentos,
vinham, em seguida, as condições para sermos financiados.
A CIA TEM UM ORÇAMENTO INFINITO
Que condições exigiam?
Diziam-nos: temos a capacidade de
colocar o mercado à vossa disposição, de levá-los ao mercado do livro, ou do
filme, ou das artes plásticas ou qualquer outra coisa, mas queremos a verdade,
porque o que se vende no mercado é a imagem de Cuba. A imagem de Cuba tem que
ser uma visão realista, das dificuldades, do que acontece no país. Queriam
viciar a realidade de Cuba. O que estavam pedindo é que fizéssemos uma critica
da revolução, com base nas linhas de propaganda contra Cuba, que eles
manejavam.
A quanto pode ascender o
orçamento dessa gente?
Eles vinham com uma quantidade
infinita de dinheiro, porque a origem do dinheiro, é claro, com o tempo
conseguimos saber de onde vinha. Por exemplo, havia a USAID, que era o maior
patrocinador, a maior contratadora de todo o orçamento, que era canalizado
através de ONGs, que muitas vezes eram inventadas para Cuba. Eram ONGs que não
existiam, que foram criadas exclusivamente para esse tipo de trabalho em Cuba e
estamos a falar de milhares e milhares de dólares. Eles não trabalhavam com
orçamentos pequeninos. Para dar um exemplo, num dado momento, a mim
ofereceram-me dez mil dólares, apenas para incluir elementos de propaganda
contra Cuba no romance em que eu estava trabalhando.
De que ano estamos falando?
Estamos em 1988, 89.
Quantas pessoas poderiam ter sido
contactadas por essa gente ou cooptadas?
Realmente não tiveram muito
sucesso, porque em Cuba havia uma cultura de confronto para tais coisas e as
pessoas tinham muito presente que poderia haver algo por trás dessa história de
querer-nos ajudar. Não era novo na história do país e, por isso, era muito
difícil chegarem a nós. Num dado momento, já em 92, tivemos uma reunião com
todos os membros da organização e foi decidido expulsá-los. Não permitir mais a
assistência a qualquer das nossas reuniões. Essa gente, que já estava chegando
com propostas concretas e também condicionando a ajuda financeira que nos
estavam dando. O que acontece é que, quando fizemos isso e os rejeitámos, os
expulsámos da sede da associação, em seguida, começaram a particularizar.
Começam a visitar-me, a mim em particular e a alguns camaradas jovens. Com
alguns foram bem sucedidos, ou seja, alguns deles conseguiram, inclusive,
levá-los para fora do país.
Que perfil procuravam eles, mais
ou menos, se se pode especificar um perfil?
Eles queriam, especialmente
naquela época, apresentar Cuba como um país que estava no caos. Que o
socialismo em Cuba havia falhado em atender às necessidades da população e que
Cuba era um país que o socialismo levara à pobreza absoluta e que, como modelo,
não agradava. Foi a chave para o que se pretendia, especialmente naquela época.
NA VENEZUELA TRABALHOU UMA AGENTE
EXPERIENTE EM DERRUBAR GOVERNOS
Quanto tempo esteve como agente
da CIA?
Estivemos nessa história até ao
início do ano de 94. Porque em 94 eu venho para Havana, volto para a capital e
aqui, vou trabalhar no Sindicato dos Trabalhadores da Cultura, um sindicato que
representa os trabalhadores da cultura na capital, o que me tornou ainda mais
interessante para eles, porque deixava de ser um líder de uma organização de
jovens com 4.000 membros, para passar a liderar uma organização sindical com
40.000 membros. Ou seja, uma união com 40.000 membros, apenas na cidade de Havana.
Então isso tornou-se muito mais interessante. Eles continuaram os contactos.
Naquele momento apareceu um novo professor universitário que veio com a missão
de promover a produção de meu trabalho literário, para se tornar o meu agente,
para organizar eventos.
Pode dar o nome ?
Não,
porque usavam pseudónimos. Nunca nomes reais. E esse tipo de trabalho, de me
promover como escritor, era no que eles estavam muito interessados, porque
queriam tornar-me uma personalidade dentro desse mundo. Promovendo-me agora, e
comprometendo-me com eles de maneira não directa. E então, em 2004, chega aqui
a Havana uma pessoa que é bem conhecida na Venezuela, Kelly Keiderling . Kelly chega a
Havana para trabalhar como Chefe do Gabinete de Imprensa e Cultura. Preparam
uma reunião. Preparam um cocktail e neste cocktail eu tenho uma reunião com
doze funcionários norte-americanos e europeus. Não eram só americanos.
Todos
pessoas que tinham experiência, alguns com experiência mesmo dentro da própria
União Soviética, outros tinham participado em acções de formação e preparação
de gente na Jugoslávia, nas Revoluções coloridas, e estavam ansiosos por me
conhecer. Kelly torna-se uma pessoa muito próxima. Começa a preparar-me. Começa
a instruir-me. Eu começo a receber dela uma formação muito sólida: a criação de
grupos alternativos, a criação de grupos independentes, a organização e
formação de jovens líderes, especialmente em projectos culturais, mas que foram
sempre alternativos, que não participaram nos trabalhos das instituições
culturais
. Isso foi no ano de 2004-2005. Kelly sai praticamente de cena em
2005-2006. E começo a trabalhar, ela apresenta-me, coloca-me em contacto
directo com funcionários da CIA. Supostamente, eu já estava comprometido com
eles, estava pronto para a próxima missão, e colocam-me em contacto com Renee
Greenwald, um responsável da CIA que começa a trabalhar comigo directamente, e
com um senhor chamado Mark Waterhein que era, naquele tempo, o chefe do
Projecto Cuba, da Fundação Pan-americana para o Desenvolvimento.
CENTENAS DE JOVENS VENEZUELANOS
FORAM COOPTADOS PELA CIA
'. Esse senhor Mark , além de
dirigir o Projecto Cuba, tinha uma ligação directa com Cuba, na questão do
financiamento de projectos contra a Revolução e também estava envolvido em tarefas
contra a Venezuela. Quero dizer, ele era um homem que, como muitos de sua
equipe, funcionários do famoso projecto, também trabalhou contra a Venezuela na
época. Eles estavam intimamente ligados. Às vezes tinha dificuldade em
diferenciar quem trabalhava com Cuba, e quem não, pois muitas vezes alternavam.
Por exemplo, havia venezuelanos que vinham trabalhar comigo, que trabalhavam em
Washington, que estavam subordinados à Fundação Pan-Americana e à CIA e vinham
a Cuba para treinar-me e trazer suprimentos. Daí sai a ideia de criar uma
fundação, um projecto, que se chamou Génesis.
Génesis é, talvez, a matriz, como
ideia, de muitas das coisas que aconteceram no mundo de hoje, agora mesmo,
porque Génesis é um projecto destinado a estudantes universitários cubanos.
Estavam fazendo algo semelhante na Venezuela. Porque, o que acontece? A ideia
era transformar as universidades – que sempre tinham sido revolucionárias, que
tinham produzido revolucionários, de onde haviam saído muitos dos
revolucionários de ambos os países – e convertê-las em fábricas de
reaccionários. Então, como fazer isso? Formando líderes. O que começaram a
fazer na Venezuela? Enviavam estudantes para a Jugoslávia, financiados pelo
Instituto Republicano Internacional (IRI) , que era financiado pela USAID e
pelo Instituto Albert Einstein, enviados em grupos de dez, com o seu professor.
Conhece os nomes dos
venezuelanos?
Não, estamos falando de centenas.
Eu falava com o professor e via que um grupo se seguia a outro. Porque eles
estavam trabalhando a longo prazo. O plano era o mesmo contra Cuba. Génesis
promovia, dentro da universidade, um sistema de bolsas para a formação de
líderes para alunos cubanos e professores cubanos. O plano era muito similar.
Mesmo em 2003, eles prepararam, aqui em Havana, um curso na Secção de
Interesses dos Estados Unidos, chamado "Derrubando um líder, derrubando um
ditador", que se baseava na experiência da Otpor para afastar Milosevic do
poder. E é a ideia, dentro da universidade cubana, de que estão trabalhando a longo
prazo, porque todos esses projectos sempre têm um longo prazo, para ter
resultados. Por isso, também começaram cedo na Venezuela. Eu acho, embora não
tenha provas, mas acredito, que na Venezuela começou antes do governo Chávez,
porque o plano de transformar as universidades latino-americanas, que sempre
foram centros de processos revolucionários em universidades reaccionárias, é
mais velho que o processo venezuelano para reverter a situação e criar uma nova
direita.
A CIA TRABALHA EM TODA A
VENEZUELA
A CIA só trabalha em Caracas?
Não, em toda a Venezuela. Naquela
época, Génesis tinha em Cuba um plano de bolsas para formar líderes. Propunham
aos estudantes uma bolsa de estudos numa universidade dos EUA, ou uma grande
universidade europeia para os treinar como líderes, com tudo pago. Pagavam as
despesas, pagavam bolsas completas. Estamos falando do ano de 2004-2005. Era
muito evidente. Então, esses líderes voltariam para a universidade em algum
momento. São estudantes. Vão acabar a sua carreira. Esses líderes, quando
terminem as suas carreiras, vão ocupar diferentes cargos, diferentes
possibilidades, como engenheiros, como graduados em diferentes sectores da
sociedade cubana, mas outros vão ficar constantemente preparando líderes dentro
da universidade. Uma das missões mais importantes dos líderes da universidade,
era ocupar a liderança das principais organizações de jovens. No caso de Cuba,
nós estamos falando da União de Jovens Comunistas e da Federação Estudantil
Universitária, ou seja, não se tratava na época da criação de grupos paralelos,
mas tornarem-se líderes de organizações que já existiam em Cuba.
Simultaneamente, formar um grupo de líderes nas estratégias de golpe suave. Ou
seja, treinar gente para quando o momento fosse oportuno, no momento certo,
poder efectuar as famosas revoluções coloridas ou guerras não violentas que,
como se sabe muito bem, de não violentas, não têm nada.
Que perfil procuram num
professor, para ser cooptado?
Professores é muito fácil.
Identificar na universidade professores que eram pessoas descontentes com a
instituição, pessoas frustradas, por considerarem que a instituição não lhes
garantia, ou não reconhecia o seu mérito. Se eram mais velhos, ainda melhor.
Não especificavam. Escolhem pessoas mais velhas, para que as selecciones. Se
lhe envias um plano de bolsas de estudo, ou ele recebe um convite para
participar de um grande congresso internacional de determinada ciência ele vai
ficar-te eternamente grato, porque foste o único que descobriu o seu talento,
que nunca havia sido reconhecido pela universidade. Então, a esse homem que tu,
que estás na sua universidade, levaste a estudar fora, a participar de um
grande evento e lhe vão publicar a obra e lhe constroem um currículo, quando
esse homem voltar para Cuba, regressa com um enorme currículo, porque ele
participou de um evento científico de primeira classe, passou em cursos nas
principais universidades e o seu currículo quase atingiu o tecto, portanto, a
influência que poderia ter na universidade era maior, porque poderia ser
reconhecido como uma figura no seu campo, embora na prática o homem fosse um
ignorante.
REALMENTE EU NÃO ERA UM AGENTE DA
CIA, ERA UM AGENTE DA SEGURANÇA CUBANA
E qual a eficiência e eficácia de
tais cooptações, dessas missões que eles vinham promover aqui?
No caso de Cuba, não lhes deu
muito resultado. Primeiro, porque havia uma razão importantíssima: quem estava
liderando o projecto era eu e eu realmente não era um agente da CIA, era um
agente da Segurança Cubana, portanto, todo o projecto passou pelas minhas mãos,
e deveria ser o único a executá-lo e o plano passava sempre pelo trabalho que
eu podia fazer e o que fizemos foi entorpecê-lo ao máximo ao termos conhecimento
do que estava sendo planeado. Mas note-se que eles estavam calculando o fim do
seu plano para o momento em que desaparecessem as figuras históricas da
Revolução. Eles estavam calculando um período de cinco ou dez anos, para Fidel
desaparecer da cena política e desaparecerem de cena Raul e as figuras
históricas do país. Era esse o momento que estavam à espera e quando
acontecesse eu devia sair da universidade, com todo o apoio da imprensa
internacional e com o total apoio de ONGs, USAID e todas essa gente que
trabalhava em torno do dinheiro norte-americano da CIA, e emergiria uma
organização para se apresentar ao público como uma alternativa ao que estava
fazendo a Revolução. Isso é o que estava acontecendo com a Fundação para a
Liberdade Génesis.
Que Fundação é essa?
A Fundación Génesis para la
Libertad devia ter um discurso aparentemente revolucionário, porque a ideia era
confundir as pessoas. A ideia era dizer que eram revolucionários, que queriam
fazer mudanças no governo, mas quando se ia para a prática, quando se ia para a
essência do projecto, quando se perguntava, o que é o projecto? O discurso e o
projecto eram exactamente os mesmos que os da direita tradicional, porque as
mudanças que promoviam eram as mudanças que a direita, até há algum tempo,
estava promovendo no país. Na prática, quase se lhes dá uma grande
oportunidade, no critério deles, em 2006, quando saiu a notícia na televisão de
que Fidel, por causa da doença, deixava as responsabilidades que tinha no
governo e eles sempre tinham dito que a Revolução Cubana caia no dia em que
Fidel morresse. Porque a Revolução era Fidel e no dia em que Fidel não
estivesse cá, se morresse ou deixasse o Governo, no dia seguinte, a Revolução
caía, e calcularam que haveria confrontos internos, que ia haver
descontentamento com isto e com aquilo. Cálculos, que não sei de onde raio os
tiraram, mas em que acreditavam. E nesse momento eles acreditavam que era hora
de começar a agir.
CIA: O MELHOR QUE PODE ACONTECER
É QUE MATEM UM OPOSITOR
Estamos falando de 2006. E qual
era o plano?
Chamam-me automaticamente.
Reunimo-nos, o chefe da estação da CIA, aqui em Havana, também apareceram
funcionários diplomáticos e um disse-me: "Vamos organizar uma provocação.
Vamos organizar um levantamento popular num bairro no centro de Havana, que
haja uma pessoa disposta a erguer-se pela democracia, e vamos executar um
conjunto de provocações, em lugares diferentes, de modo a que as forças de
segurança cubanas sejam forçadas a actuar contra essa gente e então vamos montar
uma grande campanha de imprensa". E começa explicando como tudo isso iria
funcionar. A coisa interessante e que chamava muito a atenção, era como seria
possível que um funcionário da Secção de Interesses dos Estados Unidos tivesse
o poder de convocar a imprensa e que as pessoas obedecessem com esse
servilismo. Foi muito marcante. A ideia era, e eu disse-lhe mesmo, "o que
estás dizendo é um disparate. Quero dizer, esse homem que me mencionaste,
chamado Alci Ferrer – o jovem que tinham escolhido; um agente jovem, médico,
tinha sido escolhido para ser o líder da revolta – eu disse que esse rapaz não
moverá ninguém. Ninguém se vai levantar no centro de Havana. A data escolhida
é, nada mais nada menos, que o aniversário de Fidel e querem esse dia! Olha
amigo, se esse homem, nesse dia, aparece fazendo proclamações, ou a querer
levantar alguma coisa no centro de Havana, as pessoas vão reagir forte,
inclusive, é possível que esse homem seja morto. Porque, como é num bairro de
trabalhadores humildes, para fazer essas coisas, os vizinhos..." E ele
diz-me, literalmente, "a melhor coisa que nos pode acontecer, a nós, é que
o homem seja morto; se matam esse homem, será perfeito", e explica o que
vai acontecer. "Só é preciso que ele provoque. Que saiam à rua e haja aí
um confronto. Se isso acontecer, a imprensa será encarregada de construir o
resto". E disse, "vamos montar uma grande campanha de mediática para
mostrar que em Cuba há caos, que em Cuba há ingovernabilidade, que em Cuba Raul
é incapaz de manter as rédeas do governo, que está matando civis, que está
reprimindo os estudantes na rua, as pessoas na rua e a polícia está cometendo
crimes". Qualquer semelhança com a Venezuela, não é por acaso. É assim.
Então, o que deveria acontecer em
tais circunstâncias?
Uma vez criadas todas as matrizes
de opinião e que todos os meios de comunicação tivessem construído essa imagem,
que o mundo inteiro tivesse a visão de que em Cuba havia uma grande confusão e
estavam matando as pessoas, que estava acabando tudo, então, a minha organização
deveria cumprir a tarefa final.
A CIA TRABALHA DIRECTAMENTE COM
AS EMBAIXADAS DOS EUA NA AMÉRICA LATINA
Qual era a tarefa final?
Bem, chamar a imprensa
internacional e, na minha qualidade de professor universitário, na minha
condição de escritor, na qualidade de líder dessa organização, eu vinha
publicamente pedir ao Governo dos Estados Unidos a intervenção em Cuba, para
garantir as vidas de civis e para trazer paz e tranquilidade ao povo cubano.
Falar ao país em nome do povo cubano. Imagine-se!
Esse plano fracassa. Não deu
resultado, mas é quando se vê, mais tarde, como se arma a guerra na Líbia e a
maneira como ela é construída. Mais de 80% da informação que vimos, foi
construída, foi fabricada. Fazem o mesmo na Síria e o mesmo estão a fazer na
Ucrânia. Eu tive a oportunidade de conversar com muitos ucranianos, que estavam
na base. Pessoas que são a favor da adesão à Europa. Procurei falar com eles
nesses dias. Procurando, perguntando, como são esses processos? E eles ficaram
impressionados com as imagens que o mundo transmitiu. O que passou em Miami, e
eles mesmos dizem, nós estávamos reclamando aí, mas essas coisas que aparecem
na televisão, isso era um grupo, ou seja, havia sectores, havia lugares onde
havia grupos de direita, de muito extrema direita, onde havia este tipo de
incidentes e onde se incendiava, mas a maioria das manifestações, não tinha
tais características. Ou seja, esta é, mais uma vez, a repetição do esquema,
usando todos os meios de comunicação.
Então a relação entre a CIA e as
embaixadas dos respectivos países são directas?
Sim, completamente. Em cada
embaixada na América Latina, todas as embaixadas americanas têm agentes da CIA
trabalhando dentro delas, usando a fachada de funcionários diplomáticos.
Pelo que conhece, onde há maior
presença da CIA na região?
Bem, num determinado momento, o
Equador foi uma potência forte na matéria onde havia uma forte concentração e,
claro, Venezuela, porque em 2012, quando eu assisto à Feira do Livro em
Caracas, toda essa gente que tinha trabalhado comigo em Cuba, todos esses
agentes da CIA, incluindo Kelly Keiderling, estavam em Caracas nesse momento. E
eu participo num programa de televisão, na Venezolana de Televisión, onde
discutimos esta questão, tendo muito cuidado, porque estávamos falando de dois
países que têm relações. Esse não é o caso de Cuba, ou seja, Cuba não tem
relações com os Estados Unidos. Esse é um inimigo declarado. Mas estávamos
falando de funcionários que tinham relação diplomática e era muito complicado
fazê-lo, sem ter provas concretas que pudesse apresentar. No entanto, a
entrevista foi realizada e a denúncia do que estava acontecendo foi feita.
Kelly Keiderling é uma especialista neste tipo de guerra. Eu não tenho a menor
dúvida. Basta ver o percurso que ela tem. Os países onde esteve e quando esteve
nesse tipo de conflito.
AS AGÊNCIAS INTERNACIONAIS DE
NOTÍCIAS SÃO INFILTRADAS PELA CIA
Ela tem um percurso por uma série
de países onde ocorreram situações semelhantes à que tentou criar na Venezuela.
E quando se analisa a Venezuela e o que aconteceu nos dias de hoje e a forma
como eles agiram, eu acho que na Venezuela a característica é que eles têm sido
extremamente agressivos na manipulação da informação. A tal ponto que há
imagens que são óbvias que não são na Venezuela. Eu estava olhando para uma
muito famosa, onde aparece um soldado com um jornalista com uma câmara, que são
coreanos. Esta é uma imagem da Coreia. São asiáticos. Não se parecem nada com
venezuelanos. Até pelos uniformes usados. Eles têm sido muito agressivos com a
imagem que é projectada para o mundo sobre o que está acontecendo na Venezuela.
Eles controlam a comunicação. A imagem que maioria das pessoas no mundo está
vendo é a imagem que eles estão interessados em dar.
Eles controlam os meios de
comunicação. Você conhece algum caso de algum jornalista, conhecido ou
desconhecido, que tenha visto nos processos de treino?
Não.
CNN , por exemplo?
Não. Houve um individuo que teve
um vinculo comigo num dado momento, que serviu de ligação para conhecer um
agente da CIA, que foi Antony Golden, que era da Reuters, mas um membro
independente da Reuters. A CNN sempre esteve intimamente ligada a todas estas
coisas. A CNN, desde o seu primeiro período de trabalho, especialmente nesta
última etapa, e, especialmente, a CNN em espanhol, foi uma ferramenta
inestimável para o trabalho dessa gente, mas o problema é que tem que se entender
uma coisa, para compreender o que está acontecendo: para montar uma campanha
destas, hoje, não existe nenhuma cadeia de televisão que actue por si só.
Existem conglomerados e grupos de comunicação. Quem os dirige? Quem é o
proprietário, por exemplo, da Time Warner e AOL e todos essas grandes empresas
de comunicação, TV cabo, filmes de televisão, televisão em geral? Ah! é a
Westinghouse, é a General Electric. As mesmas que fabricam um avião de combate.
A mesma indústria de armas dos EUA são os mesmos que possuem hoje as cadeias de
televisão, das produtoras de cinema, dos jornais, a gente que produz livros.
Então, os mesmos tipos que produzem um avião de combate, um doce que vais comer
à noite, que te apresenta um artista, são os mesmos que dirigem os jornais em
todo o mundo. A quem responde essa gente?
Quando você vê o que está
acontecendo na Venezuela e compara com o que se planeou aqui, a que conclusão
pode chegar?
É uma estratégia nova, que foram
desenvolvendo com a experiência que tiveram no mundo, mas eu estou convencido
que só lhes deu resultado nos lugares onde as pessoas não apoiavam a revolução.
Conseguiram-no com Milosevic, porque Milosevic era um líder na Jugoslávia que
tinha muito fraca imagem, pelas coisas que haviam acontecido na Jugoslávia. É o
mesmo na Ucrânia, porque Yanukovich era um homem que tinha muito pouco apoio
popular e deu resultado em outros lugares, pelo fraco apoio que tinham os
governantes. Onde quer que tenha havido um governo legítimo, um governo forte e
pessoas para defender a revolução, o plano falhou.
EUA CONTINUARÃO CONSPIRANDO E
APERFEIÇOANDO A SUA CAPACIDADE DE DESTRUIR
E que fase se segue quando esse
plano falhar?
Vão continuar a fazê-lo, vão
continuar a aperfeiçoar. Nós somos o inimigo. Por outras palavras, Venezuela,
Cuba, tudo o que está sendo feito na América Latina como alternativa. Nós somos
os dissidentes do mundo. Vivemos num mundo onde o capitalismo domina. Onde
domina esta nova maneira de ser do capitalismo, que já nem sequer se pode
chamar imperialista, é algo novo, algo que vai muito além do que os estudiosos
do marxismo escreveram, anos atrás. É algo novo, uma novidade. É um poder
praticamente global, das grandes transnacionais, dos megalopólios que foram
criados. Então, o inimigo somos nós. Estamos apresentando um projecto
alternativo. A solução que o mundo nos propõe não é isso. Sabemos como fazê-lo
e Cuba, Venezuela, os países da ALBA, têm demonstrado que se pode fazer. A
Revolução Cubana tem 55 anos de existência. Está validada por 55 anos de
existência e, com vontade política, tem conseguido coisas que os EUA, mesmo com
todo o dinheiro do mundo, não conseguiram fazer. Então, isso é um mau exemplo.
Eu dizia aos meus alunos
"vocês imaginam que os Indignados da Espanha, que milhares e milhões de
trabalhadores que não têm trabalho em Espanha, que os gregos, que todas as
pessoas em todo o mundo, sabem o que estamos fazendo? Imaginam que as pessoas
sabiam quem era Chávez? Ou, quem é Fidel? Ou as coisas que estamos fazendo
aqui? E as coisas que estamos fazendo com tão poucos recursos, apenas com a
vontade de fazer a revolução e repartir a riqueza? O que aconteceria com o
capitalismo? Quanto duraria o capitalismo, que tem que gastar milhares de
milhões de dólares todos os dias, para construir a sua imagem e enganar as
pessoas? E se as pessoas soubessem quem realmente somos? O que é realmente a
Revolução Cubana e o que é, realmente, a Revolução Venezuelana?" Falas com
um espanhol e perguntas por Chávez e ele dá uma opinião péssima de Chávez,
porque é o que construíram na sua mente; e encontras uma pessoa desempregada
que diz que Chávez é um tipo terrível, porque a Comunicação Social o tem
convencido que assim é, mas se as pessoas soubessem o que é realmente... Então
eles não podem permitir que inimigos tão formidáveis, como nós, possam estar
ali à porta.
Do ponto de vista da soberania
nacional dos nossos povos, como se pode travar o trabalho da CIA? Já falámos da
consciência do povo, que é fundamental neste tipo de acção, mas, em concreto,
como se pode prever o trabalho da CIA? O que se pode fazer? Que recomendações
faria ?
Eu acho que há uma coisa que
disse Chávez, e Fidel sempre disse, que é a chave para derrotar o Império, que
é a unidade. Não é um slogan, é uma realidade. É a única maneira que se tem de
derrotar um projecto como este. Projecto surgido a partir dos Serviços
Especiais e surgido a partir do capitalismo. Somente se pode conseguir com a
unidade do povo.
Estaríamos falando do
cívico-militar ?
Sim, a unidade em todos os
sentidos. A unidade baseada na diversidade, nos povos, mas a unidade como
nação, a unidade como projecto. Onde quer que as pessoas estejam divididas, há
outra realidade.
KEIDERLING COMO AGENTE DA CIA
CHEGOU BEM LONGE NA VENEZUELA
Onde temos que nos concentrar? Em
que área terá que se concentrar a força para nos defendermos deste tipo de
acções, desse tipo de ataque?
O exército para derrotá-lo é o
povo. Eu acho que a experiência cubana o ensinou muito bem. Há experiências no
mundo que marcam muito. O que aconteceu no mundo quando o povo não foi o
protagonista da defesa da revolução? E quando os povos têm sido o protagonista,
o que aconteceu? É o caso de Cuba. Conseguimos derrotar a CIA e o Império
milhões de vezes, porque o povo tem sido o protagonista.
A CIA usa as bases de dados de
redes sociais e esse tipo de coisas, para definir os seus planos ?
Eles são os proprietários. Bem,
aí estão as denúncias de Snowden e tudo o que saiu do Wikileaks, que não são
segredo para ninguém, porque se suspeitavam, mas agora está demonstrado.
Mostra-se que os servidores internet, são deles. Todos os servidores do mundo
acabam por morrer nos servidores norte-americanos. São a mãe da Internet e
todas as redes e serviços são controlados por eles. Eles têm acesso a toda a informação.
E não se perecebe no momento da gravação. O Facebook é uma base de dados
extraordinária. As pessoas colocam tudo no Facebook. Quem são os amigos, o que
gostam, que filmes vêem, o que bebem. E isso é uma fonte de informações em
primeiríssima mão.
Já esteve em contacto com Kelly
Keiderling depois do que aconteceu na Venezuela?
Não, não tive contacto com ela.
Não sei qual foi o seu destino final depois do que aconteceu (Foi expulsa da
Venezuela por reunir-se e financiar terroristas).
Com a experiência que ela tem,
até que ponto poderia ter penetrado na Venezuela e nas universidades
venezuelanas?
Eu tenho a certeza de que chegou
bem longe. É uma agente muito inteligente, muito bem preparada, muito capaz e
muito convencida do que está fazendo. Kelly é uma pessoa convencida do trabalho
que está sendo realizado. Convencida da justeza, do seu ponto de vista, do que
está fazendo. Porque é uma representante incondicional do capitalismo. Porque
provem da elite do capitalismo. É parte da acção que está fazendo. Não há
nenhuma contradição. E, com base na experiência do seu trabalho, na sua
capacidade, eu tenho a certeza de que chegou muito longe, conseguiu ir muito
longe e deu continuidade a um trabalho que não é novo, é um trabalho que vem
fazendo desde há muito tempo para reverter o processo nas universidades
venezuelanas. Até que ponto o conseguirão, a longo prazo, é o que vai mostrar o
processo bolivariano, à medida que as pessoas estejam cientes do que pode
acontecer. Se essa direita fascista se tornar incontrolável, vai alcançar o
poder novamente.
TEMOS QUE TREINAR OS NOSSOS
LÍDERES
Qualquer pessoa com contactos,
que tenha como chegar ao povo, como um activista de um movimento, pode ser
cooptado pela CIA?
Vão encontrá-lo, vão tentar
fazê-lo. Se é jovem e é um líder, vão tentar cooptá-lo para os seus interesses.
Temos que formar os nossos líderes. Não podemos deixar isso à espontaneidade,
nem podemos deixar isso para o inimigo. Se deixarmos isso ao inimigo é o
inimigo que ocupa os espaços. Projecto alternativo que nós deixemos sem
vigilância, projecto alternativo que não estejamos conscientes da necessidade
de abordá-lo, é um projecto em que o inimigo vai tentar, por todos os meios,
que seja feito por ele. Usando a grande quantidade de dinheiro que tem para
isso, que não tem limite, em termos de recursos para usar, porque se eles estão
jogando o futuro, sobretudo, os jovens são a chave.
A coisa boa é que os jovens são o
presente da América Latina. A revolução latino-americana que está aí, que está
em toda parte, é jovem. Se não, bem, nunca iria resultar e se conseguires que
esses jovens pensem diferente, se conseguires que estes jovens acreditem que
este capitalismo selvagem é a solução para todos os seus problemas, então não
há revolução para a América Latina. Tão simples como isso.
Ver também:
ZunZuneo, provocación anticubana
en las redes sociales
La NED, tapadera de la CIA y el
golpismo en Venezuela
Venezuela ante la ofensiva
imperial
O original encontra-se em
www.aporrea.org/actualidad/n247624.html . Tradução de Guilherme Coelho.
Esta entrevista encontra-se em
http://resistir.info/ .
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