Heitor Scalambrini Costa *
Em recente visita a microrregião de Itaparica, aos municípios de Floresta, Belém do São Francisco, Petrolândia e Itacuruba, pude constatar, a completa falta de informação das respectivas populações sobre a provável instalação de uma usina nuclear na região.
A visita, que contou com o apoio
da Diocese de Floresta através do Movimento Cultura de Paz, teve o objetivo de
levar informações sobre a energia nuclear, a radioatividade, os efeitos da
radiação, o que é uma usina nuclear e como funciona, os riscos de acidentes e a
situação desta fonte energética no mundo e no Brasil. Além de haver uma
discussão sobre outras fontes de energia, em particular aquelas encontradas na
natureza, que poderiam atender a demandas energética destas populações.
Foram realizadas Rodas de Dialogo
nos quatro municípios com a presença de educadores, religiosos, políticos,
representantes da sociedade civil organizada, movimentos de jovens, representantes de grupos quilombolas e
indígenas. Amplo material de divulgação foi distribuído aos participantes,
desde cartilha explicativa, cordéis, e-books com artigos sobre a questão
nuclear e panfletos.
Como resultado das Rodas de
Dialogo foram definidos em cada cidade, ações que serão desenvolvidas no
intuito de mais e mais pessoas se incorporarem ao debate sobre a instalação da
usina nuclear. Assunto de grande importância para o destino dos moradores das
cidades e do campo daquele território.
O trabalho planejado durante
estes reuniões se dará essencialmente na divulgação pelas redes sociais, em
ações nas escolas estimuladas pelos educador@s, na distribuição de material
informativo aos membros das associações de moradores, associações de
pescadores, comerciantes, nas aldeias indígenas e nas comunidades quilombolas.
O que se espera de toda esta movimentação é que as populações se envolvam neste
debate, e como resultado, formem opinião sobre a decisão unilateral tomada de
se instalar a usina nuclear. Espera-se que sejam ouvidos, e tomem em suas mãos
a responsabilidade de aceitarem ou não esta instalação industrial para produzir
energia elétrica. O que não se pode mais aceitar e nem admitir são que decisões
sejam tomadas à revelia, sem a participação dos principais interessados.
Por outro lado nestas reuniões, o
que era esperado aconteceu. Mesmo convidado à classe política não esteve
presente, e quando alguns de seus membros compareceram, foi de maneira não
participativa nos debates. O que se percebe nesta atitude é que fogem da
discussão pública. Evitam se comprometerem, e nem emitem suas opiniões
publicamente. Todavia, à surdina, conspiram para a vinda da usina nuclear para
a região, apoiando interesses pessoais em detrimento do interesse público, da
coletividade, das comunidades.
Também nesta viagem, tornou mais
claro o interesse econômico envolvido com a construção da usina nuclear no
município de Itacuruba. A área pré-selecionada a beira do rio São Francisco
possui diversos proprietários em todo seu entorno. A maior propriedade em
extensão pertence a parentes do ex-prefeito de Itacuruba,. Estivemos com um dos
outros proprietários de terras na região (possui uma gleba de 130 ha), que nos
informou já ter sido procurado pelo ex-prefeito interessado em comprar suas
terras, como também de outros proprietários que teriam sido procurados para
este fim.
Verifica-se nesta movimentação o
interesse de tornar-se o único proprietário das terras, e assim poderem ser negociadas, e muito bem
indenizadas pelo governo federal, caso a usina nuclear seja implantada na
região. Também para valorizá-las, o ex-prefeito na sua gestão, obteve recursos
do Ministério da Integração Nacional/Codevasf para a implantação e pavimentação de uma rodovia vicinal até
estas terras, chegando bem próximo a fazenda Jatinã (local pré selecionado para
a implantação da usina nuclear). Esta rodovia, um trecho da PE 422, atravessa
terras da aldeia Pankará e comunidades quilombolas, Por exigência da comunidade
indígena, licenças para esta rodovia nunca foram apresentadas, e as obras foram
paradas. Os recursos públicos destinados para esta rodovia foram de R$
13.488.205,55.
O discurso proferido por este
político na defesa intransigente da usina nuclear, caminha no sentido que a
usina trará impactos econômicos importantes para a região, e como consequência,
o desenvolvimento e o progresso tão almejado pelos habitantes. Este discurso,
recorrente, já que utilizou os mesmos argumentos quando prometeu e não cumpriu
o Observatório de Itacuruba
(http://www.debatesculturais.com.br/observatorio-de-itacuruba-uma-obra-inacabada/),
aponta na geração de emprego e renda para a população. Todavia, esconde de fato
o mero interesse pessoal, em detrimento ao da coletividade, que sofrerá os
impactos e o estigma que esta construção trará aos moradores do seu entorno.
Em verdade, o que tem movido a
defesa desta obra na região, por alguns que exerce grande influencia junto às
populações pelo fato ocuparem (ou já ocuparam) cargos públicos na política
local, são os benefícios financeiros que receberão com a implantação desta
obra.
Esta situação se verifica quando
defensores do modelo predatório de desenvolvimento em curso no Estado, com
obras como da instalação de uma indústria de petróleo e gás, termoelétricas a
combustíveis fósseis, construção de estaleiros, de indústrias altamente
poluentes no Complexo de Suape; locupletam-se financeiramente. Afinal é tudo por dinheiro.
Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de
Pernambuco
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