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quarta-feira, 6 de junho de 2012

Os professores perderam a paciência


 
Estudantes e professores da Unifesp em greve realizam manifestação na
Avenida Paulista - Foto: Simon Plestenjak/Folhapress
   
Paralisação dos docentes universitários demonstra capacidade de alcance e envolve a maioria das Instituições de Ensino Superior.
                                                        Pedro Carrano
O protagonismo dos professores voltou à cena no dia 17 de maio, quando a greve dos professores das Instituições de Ensino Superior alcançou 48 universidades, de uma soma total 59 locais de ensino em todo o país. A paralisação alcançou inclusive as capitais da Região Norte, muitas das quais não haviam participado da greve de 2011, o que mostra um ânimo diferente no interior do magistério e, também, começa a desenhar o esboço de uma greve nacional de servidores federais. Desde o ano passado, reivindicações se acumularam e levaram à atual paralisação. Agora, integrantes de comandos locais de greves apontam o foco do movimento em questões de fundo, tal como a reestruturação da carreira dos docentes com treze níveis remuneratórios, baseados no tempo de carreira – após dois anos da apresentação dessa proposta do Andes (Sindicato nacional dos professores universitários) para o governo.

De um histórico de 17 greves em 32 anos, uma das mais recentes greves de expressão nacional havia acontecido em 2005, chegando a 50 universidades. Hoje, a realidade aponta casos como o da Universidade Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri, a mais recente dentre as 10 universidades federais de Minas Gerais – a primeira localizada na região norte do estado, construída com recursos do Reuni, e que aglutina estudantes de toda a região. É um exemplo da crítica comum também noutros estados: em que pese os recursos e a ampliação da oferta de ensino e da inserção de estudantes, próprios desse programa de reestruturação, os professores reclamam das condições de estrutura e trabalho.

Coincidentemente, esse fato também mereceu reportagem da revista Carta Capital, referindo-se à situação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Michelly Ferreira Monteiro Elias é professora do Departamento de Serviço Social da Universidade do Vale do Jequitinhonha e integra o Comando de Greve local, apontando na universidade problemas tais como o déficit de professor por aluno, o que prejudica a relação entre ensino, pesquisa e extensão, ao lado de problemas de infraestrutura e obras inconclusas. Na leitura de Michelly, esse conjunto de críticas soma-se à pauta nacional, pontuada pela demanda do plano de carreira docente e reajuste salarial. “Além da pauta nacional, fizemos uma pauta local, e tivemos adesão maciça às greves”, narra, fazendo a ressalva de que a crítica ao programa não é o mesmo que criticar o recente aumento da oferta de vagas nas universidades: “mas o Reuni vem engessado com números, sem considerar o conjunto de atividades que esse professor precisa fazer. Aumenta as demandas administrativas para os professores”, enumera.


“Focamos em dois pontos principais, que servem de bandeira para a greve. O primeiro é a discussão de carreira, o segundo é o ponto das condições precárias da universidade, o que atrai os estudantes. Na carreira se decide para onde a universidade está indo. Se deve ou não ascender na carreira. O governo defende uma avaliação produtivista e com metas”, critica Almir Menezes Filho, integrante do Comando de Greve Nacional (CGN) do Andes/SN.

Envolvidos no movimento estão profissionais de universidades federais, estaduais, institutos, que ganham o apoio de conselhos universitários locais e participação do movimento estudantil universitário, que declarou greve em 32 universidades, de acordo com o Andes. Um exemplo de mobilização da juventude aconteceu no Rio de Janeiro, no dia 31 de junho, quando cerca de 200 manifestantes da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, em greve desde o dia 16 de maio, ocuparam a BR- 465, como forma de protesto e reivindicação das pautas.

Resquício da ditadura

A realidade é que o capital financeirizado nada de braçadas, enquanto o investimento na educação não é contemplado. O superávit primário (receitas menos despesas, excluídos os juros da dívida) do setor público consolidado – governo federal, estados, municípios e empresas estatais – chegou a R$ 14,24 bilhões, apenas em abril de 2012, segundo dados do Banco Central (BC). Enquanto isso, o investimento médio em Educação, de acordo com dados de 2011, chega a R$ 46,97 bilhões, e isso no período de um ano. Dentro do orçamento anual, o investimento em educação compreende exatos 2,99%, de acordo com a entidade Jubileu Sul Brasil.

Como herança da ditadura militar, os setores privados passam a ganhar espaço e se apropriar da educação pública. Nas décadas de 1960 e 1970, período marcado pela ditadura militar, a participação do setor privado cresceu de 40% até pouco mais do que 60% das matrículas. Após uma década sem aumento dessa participação, a privatização voltou a crescer após 1990, período marcado pela expansão do neoliberalismo, continuando a aumentar ao longo da década seguinte. Chegamos hoje a uma taxa de privatização de 75% do ensino superior.

Essas características estruturais da Educação no Brasil se devem ao modelo de subordinação da economia ao capital financeirizado e à inserção do país na divisão internacional do trabalho.

“A greve é uma oportunidade para colocar o papel da educação diante de uma configuração de projeto de nação, quando a elite abandonou essa perspectiva”, afirma Rafael Villas-Bôas, pesquisador e professor universitário da Universidade Nacional de Brasília (UNB), que descreve o atual modelo de educação do país dentro de uma lógica produtivista a que os professores são submetidos. “Ninguém é contra o crescimento, mas lutamos pelo desenvolvimento. O modelo de universidade como prestadora de serviços não está conectado com um projeto de país, mas articulado com o grande capital nacional e internacional, grande empresas do agronegócio”, afirma.


Fonte: site Brasil de Fato

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