por Daniella Jinkins
De acordo com o estudo da
Pastoral Carcerária e do ITCC, medida tem sido utilizada pelo governo paulista
“como instrumento político de gestão populacional”
Relatório elaborado pela Pastoral
Carcerária Nacional e pelo Instituto Terra,Trabalho e Cidadania (ITTC) afirma
que a prisão provisória tem sido usada em São Paulo “como instrumento político
de gestão populacional, voltado ao controle de uma camada específica da
população”. A Agência Brasil teve acesso à integra do relatório, que deve ser
divulgado essa semana.
De acordo com o documento, o uso
da prisão provisória tem sido dirigido a usuários de drogas e moradores de rua
da capital paulista. São Paulo é o estado com maior quantidade de presos
provisórios do país. De um universo de 174 mil detentos, 57,7 mil estão
privados de liberdade e ainda não foram julgados.
Segundo a pesquisa, juízes e
promotores corroboram a seletividade e a violência promovidas pelas polícias e
raramente questionam a necessidade da prisão cautelar. “Há uma grande
resistência dos operadores [do direito], que não se dão ao trabalho nem mesmo
de atentar para o caso concreto, emitindo cotas e decisões caracterizadas pela
generalidade e pela pobreza argumentativa”.
O relatório diz ainda que
“inverte-se o princípio da presunção de inocência, mantendo-se a pessoa privada
de liberdade de forma automática, como se o estado de flagrância constituísse
prova suficiente da culpabilidade ou como se a prisão cautelar funcionasse como
a antecipação de uma pena que não será aplicada ao final do processo”.
De acordo com o documento,
inúmeros relatos de presos provisórios denunciam que, no momento da abordagem
policial, quando estavam utilizando drogas em grupo, os policiais liberavam
diversos usuários e prendiam alguns outros, em uma forma discricionária de
condução da abordagem.
“A escolha entre quem seria
liberado ou preso era fundada na ficha do indivíduo – reincidente ou primário
–, na sua cor ou raça, na sua vestimenta, na sua classe social. Foi possível
perceber o imenso poder que a atual Lei de Drogas confere aos policiais, que
podem tipificar determinada conduta como bem desejam”, diz o relatório.
O coordenador do Núcleo de
Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Patrick
Cacicedo, também entende que há abuso por parte das autoridades na hora de
prender as pessoas provisoriamente. “O estado quer resolver questões sociais
pelo sistema penal. Por isso, há hoje um encarceramento em massa”.
A Agência Brasil procurou as
secretarias de Administração Penitenciária e de Segurança Pública de São Paulo,
o Ministério Público e o Tribunal de Justiça de São Paulo, mas até o fechamento
desta reportagem não havia recebido resposta.
O relatório é resultado do
Projeto Tecer Justiça: Repensando a Prisão Provisória, desenvolvido pelo
Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC) e pela Pastoral Carcerária
Nacional para o atendimento e a defesa técnica de presos provisórios
recém-incluídos no Centro de Detenção Provisória 1 de Pinheiros e na
Penitenciária Feminina de Sant’Ana. A pesquisa foi realizada no período de
junho de 2010 a dezembro de 2011.
O documento analisa diversos
casos de permanência em detenção supostamente ilegal, entre eles o de um homem
preso sob acusação de ter roubado R$ 1,00 e um bilhete de transporte público
mediante ameaça verbal, sem uso de arma ou qualquer utensílio que pudesse
colocar em risco a integridade da vítima.
No entanto, apesar de ser
primário e nunca ter sido sequer processado, o homem permaneceu seis meses e
doze dias preso antes da sentença. As sentenças judiciais também se apresentam
desproporcionais: nesse mesmo caso, o homem foi condenado à pena de cinco anos
e quatro meses de reclusão em regime inicial fechado.
De acordo com o assessor jurídico
da Pastoral Carcerária Nacional, José de Jesus Filho, em muitos casos, os
presos provisórios são usuários de drogas que ficam até um ano encarcerados.
Além disso, é bastante elevado o número de pessoas que afirmaram morar na rua.
No ano passado, entrou em vigor a
Nova Lei das Prisões, que beneficia presos não reincidentes que cometeram
crimes leves, puníveis com menos de quatro anos de reclusão, e que não ofereçam
risco à sociedade. Em tais casos, a prisão pode ser substituída por medidas
como pagamento de fiança e monitoramento eletrônico.
Segundo o relatório, no entanto,
há diversos casos nos quais o réu estava sendo acusado de delito para o qual
poderia receber uma medida alternativa à prisão. Porém, mesmo assim, o acusado
era mantido preso cautelarmente até a sentença. Somente então o réu é colocado
em liberdade, até mesmo quando condenado, porque o período sob prisão
provisória geralmente foi maior que o tempo de condenação.
O Instituto Terra, Trabalho e
Cidadania é uma organização não governamental, com sede em São Paulo,
constituída por profissionais que atuam em defesa dos direitos dos cidadãos.
Atualmente, desenvolve projetos em parceria com a Secretaria de Administração
Penitenciária do Estado de São Paulo e a Defensoria Pública da União, entre
outras instituições. A Pastoral Carcerária é uma organização ligada à
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), promovendo direitos da
população custodiada nos sistemas prisionais do país.
Fonte: site Brasil de Fato e Agência Brasil de Daniella Jinkins
Nenhum comentário:
Postar um comentário