Apesar de seu caráter essencial,
o setor elétrico brasileiro não tem sido levado em conta com a relevância
necessária para atender os interesses estratégicos da população. Ele tem tido
um papel que o situa no jogo da disputa eleitoral. Ou seja, vivemos a partidarização
energética, que ficou evidenciada desde o inicio do século XXI. E isso não tem
contribuído para encontrar os caminhos da segurança energética, da modicidade
tarifária, da qualidade dos serviços oferecidos, e ainda mais, a diminuição dos
impactos socioambientais na escolha das fontes energéticas.
O processo de reestruturação do
setor elétrico iniciado em 1995, com a “meia sola” do que ficou conhecido como
o "Novo Modelo do Setor Elétrico" a partir da lei 10.848 de março de
2004, que instituiu as atuais bases do mercado de energia brasileiro,
desestruturou por completo o sistema existente, principalmente com a introdução
de um modelo mercantil. A partir de então a energia elétrica é tratada e
sujeita as leis de mercado. Não muito diferente de um pacote de bolacha
comprado no mercadinho da esquina.
O que poderia parecer uma
vantagem comparativa devido a ¾ da energia elétrica produzida no país ser
gerada nas hidroelétricas (o restante com as termoelétricas, mais caras),
acabou se tornando um grande motivo de preocupação. Em particular, devido às
mudanças climáticas e seus efeitos decorrentes, que cada dia mais tem assola o
planeta Terra. Por exemplo, o calor extremo no Sudeste e a seca no Nordeste
brasileiro. O que está acontecendo agora, portanto, é exatamente o que os
cientistas do clima preveem que começará a ocorrer com mais frequência daqui
para frente.
Virou moda, ainda mais em ano
eleitoral, falar mal da política energética do governo federal. Em parte com
toda razão, visto as consequências nefastas do modelo mercantil adotado, e que
resultou em tarifas escandalosamente altas, uma sofrível qualidade no
abastecimento com as interrupções frequentes no fornecimento de energia
elétrica, os apagões (na geração e transmissão) e os apaguinhos (na
distribuição). Além dos riscos cada vez maiores do racionamento.
Todavia o que chama a atenção, e
nos indigna é a critica partir de setores, de pessoas, que até “ontem” estavam
à frente da gestão da política energética, e que foram e são os responsáveis,
coadjuvantes diretos juntamente com os gestores atuais, dos descaminhos e
descalabros, que tem levado a tanta insegurança e problemas para o presente e futuro do Brasil.
Nas criticas atuais que partem de
candidatos presidenciais (ora aliados, ora opositores), políticos oportunistas,
“especialistas” de plantão (cada partido político tem o seu), de jornalistas
setoriais, de consultoras, lemos, vemos e ouvimos uma ladainha que se repete
insistentemente, não importa que o que se defende hoje, se ataque amanhã. São
visões de curto prazo, imediatistas, cujo objetivo é o desgaste político. Não
existe compromisso com as idéias, com a coerência, enfim com o país. É um
vale-tudo onde a busca pelo poder político é o que interessa, mesmo que para
isso o país afunde.
O que importante é minar quem
esta no poder. E ai, se incluem os “lobistas”, fabricantes de equipamentos que
querem “vender” sua tecnologia, as grandes construtoras que querem construir
mais e mais usinas, escritórios de engenharia. Aqui é o interesse econômico que
prevalece ao interesse nacional.
O que é comum na política
energética do governo anterior e do vigente é a falta de planejamento (em uns
mais e outros menos), de investimentos necessários à modernização do sistema de
transmissão e distribuição, a valorização dos técnicos e funcionários do setor,
a falta de apoio na diversificação da matriz elétrica incorporando novas fontes
renováveis de energia (sol, vento), uma política agressiva de conservação e uso
eficiente de energia em conjunto com uma política industrial destinada a
equipamentos mais eficientes, e uma falta de transparência crônica aliada a
decisões antidemocráticas do Conselho Nacional de Política Energética. Que dê
Conselho não tem nada, simplesmente aprova as propostas do poder executivo. E
sem dúvida urge desbancar grupos políticos conservadores, retrógrados e com uma
ética questionável no manejo da coisa pública instalados há décadas no
Ministério de Minas e Energia.
A receita para sair do “buraco
negro” em que se meteu o setor elétrico brasileiro requer vontade política. Mas
que lamentavelmente nem o atual governo tem, e nem os anteriores tiveram.
Portanto cabe a nós, o povo, decidir o que realmente queremos para nosso país.
O resto são churumelas.
Heitor Scalambrini Costa é Professor
da Universidade Federal de Pernambuco
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