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terça-feira, 16 de julho de 2013

O golpe de Estado no Egito: Islamismo, democracia, revolução


Quando uma “democracia burguesa” é derrotada por exército fascista, o resultado chama-se tecnicamente e politicamente – “golpe de Estado”. Se milhões de pessoas, inclusive muitas das quais revolucionárias no primeiro sentido acima, pedem golpe de Estado, nem por isso o golpe deixa de ser golpe


por Santiago Alba Rico 

Podemos falar de “revolução” nos seguintes casos

Quando uma maioria social, com interesses diversos ou não, e mesmo que não tenha programa político, derruba uma ditadura.


Quando um programa político de transformações radicais, pelas armas ou não, e com o apoio de uma maioria social, impõe-se sobre uma “democracia burguesa”.

No Egito, houve revolução, no primeiro desses sentidos, em 2011. E até agora não houve revolução alguma, no segundo desses sentidos. E a derrubada, agora, de Morsi, não se encaixa – é evidente – em nenhuma das duas definições acima.

 Não havia ditadura a derrubar no Egito (só uma limitada “democracia burguesa”), e não há qualquer programa político de transformações radicais em jogo, pelo menos que a maioria da praça aprove.

 Quando uma “democracia burguesa” é derrotada por exército fascista, o resultado chama-se – tecnicamente e politicamente – “golpe de Estado”. Se milhões de pessoas, inclusive muitas das quais revolucionárias no primeiro sentido acima, pedem golpe de Estado, nem por isso o golpe deixa de ser golpe.

 Se milhares de pessoas na praça não querem a intervenção do Exército – porque são revolucionárias também no segundo sentido do termo “revolução”, acima –, o golpe de Estado anula completamente a vontade delas.

 Exército fascista que destitui e sequestra presidente eleito; que suspende a Constituição; que dissolve o Parlamento; que mete na prisão os dirigentes do partido majoritário; que fecha suas televisões e seus jornais; que atira contra membros e militantes do partido majoritário está dando um golpe de Estado. Se é apoiado por muita gente, o golpe é mais fácil. Se, além do mais, a esquerda também apóia o golpe e põe-se a chamá-lo de “revolução”, então, o golpe é facílimo.
 

No mundo árabe não havia nem há condições para que se produza revolução no segundo sentido aqui comentado. Por que era importante – crucialmente importante – que se produzissem revoluções no primeiro dos dois sentidos? Por dois motivos.

 Primeiro, porque o estabelecimento de uma “democracia burguesa” sob impulso dos povos permitia a formação de um novo sujeito político e a construção, nas novas condições democráticas, de alternativas coletivas até agora inexistentes e inimagináveis.

 Segundo, porque uma “democracia burguesa” traria à luz a verdadeira relação de forças na região, favoráveis aos islamistas. Era um perigo, sim, mas também uma necessidade inescapável, por todas essas ditaduras haviam justificado seu poder – e a repressão de todas as expressões políticas, incluída a esquerda – contra o “terrorismo islâmico”, que elas mesmas alimentavam, num enlace felizmente eterno para os caudilhos, mediante a repressão e a tirania.

 A normalização política abria a esperança de uma “democratização do islamismo” através do exercício do governo, como aconteceu em parte em Túnis e também no Egito antes da derrubada de Morsi. A busca do confronto a qualquer preço, e a estratégia de perseguição e derrubada por qualquer meio, só pode abortar, por assim dizer, “o amadurecimento do fracasso” do projeto islamista, que é inevitável, mas que se deve produzir num marco democrático, se não quisermos voltar ao trágico “dia da marmota” que há décadas cobre a região de sangue e subjuga seus povos.

 A esquerda, desgraçadamente, se prestou a esse jogo no qual só o “ancien regime” pode vencer.


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