por José Paulo Tupynambá,
Em audiência pública conjunta, as
Comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Serviços de Infraestrutura (CI)
ouviram dois especialistas em exploração de petróleo, que trouxeram argumentos
favoráveis ao cancelamento da licitação para o Campo de Libra e sua entrega à
Petrobras. A audiência, solicitada pelos senadores Roberto Requião (PMDB-PR) e
Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), destinou-se a discutir os avanços do novo marco
do petróleo da chamada camada pré-sal.
Fernando Siqueira,
vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, afirmou que os
países desenvolvidos, altamente dependentes do petróleo como fonte de energia,
pressionaram pela rápida exploração do Campo de Libra, a maior reserva
descoberta nos últimos 20 anos em todo o mundo. Estima-se que o petróleo do
pré-sal tem reservas de pelo menos 100 bilhões de barris, podendo chegar a 300
bilhões.
O engenheiro lembrou que, tão
logo foram confirmadas as reservas, o presidente americano George W. Bush
reativou a 4ª Frota da Marinha Americana, para garantir a segurança do
Atlântico Sul.
“Ou seja, pressionar o governo
brasileiro para entregar esse pré-sal”, opinou.
Fernando Siqueira observou que as
grandes empresas americanas que não se inscreveram para participar do leilão
estão, na verdade, participando indiretamente, representadas neste por suas
ramificações europeias. Para o especialista, as empresas americanas optaram por
não participar numa tentativa de minimizar as consequências da denúncia de
espionagem sobre a Petrobras, que poderia inviabilizar a realização do leilão
do Campo de Libra.
O representante dos engenheiros
da Petrobras informou que o software Openwells, utilizado pela empresa para
compilação de dados geológicos, pertence à Landmark. Esta empresa, por sua vez,
faz parte do conglomerado de empresas Halliburton, que atua na produção de
petróleo e na indústria bélica e teve forte participação na guerra do Iraque.
Os consultores da Landmark que trabalham para a Petrobras têm acesso a todas as
informações do registro do software, como detalhes de todos os postos
marítimos, além de janelas que permitem amplo acesso à espionagem dentro da
própria Petrobras. Os dados são criptografados, explicou, mas por sistemas
desenvolvidos por três empresas americanas.
Fernando Siqueira questionou ainda
o valor altíssimo do Bônus de Assinatura previsto no leilão, no valor de R$ 15
bilhões, que deve ser pago à vista pelo ganhador da licitação. Para ele, o
governo optou por ter um dinheiro no curto prazo, para garantir o superávit
primário, mas para isso sacrificou recursos que seriam usufruídos por três
gerações de brasileiros. Acrescentou que a exigência do bônus retirou empresas
brasileiras do certame e dificultou muito a participação da própria Petrobras.
“Foi um erro estratégico
monumental”, afirmou.
Juros de 22%
Outro convidado da audiência
pública foi Paulo Cesar Smith Metri, mestre em Engenharia Industrial na Georgia
Institute of Technology. A única vantagem que citou para a realização do leilão
é a maior arrecadação a curtíssimo prazo, com o recebimento do bônus. Ele
criticou o baixo percentual de remuneração para a União prevista na licitação,
de no mínimo 41,65% do chamado óleo excedente (o equivalente ao lucro líquido),
quando o próprio mercado, segundo ele, esperava entre 65% e 75%.
Para ele, houve “uma clara troca
de recursos de médio e longo prazo por recursos de curtíssimo prazo”,
resultando em um financiamento indireto cuja taxa de juros, calculou, são de
altíssimos 22% ao ano.
“Claramente o governo brasileiro
resolveu tomar um empréstimo. Para receber no curto prazo, deu recursos a médio
e longo prazo”, afirmou.
Metri disse que o campo de Libra
poderia ser declarado uma área estratégica pelo governo, como prevê a Lei
12.351/2010 (que tratou dos contratos de partilha). Se isso ocorresse, a União
poderia contratar a Petrobras diretamente. Neste caso, a empresa poderia
destinar ao Fundo Social do Pré-Sal até 80% do óleo excedente, contra 45% que
ele estima que seja oferecido na licitação. Ele concordou que o alto valor do
bônus prejudica a concorrência para o leilão.
Metri argumentou ainda que a
exploração pela Petrobras incentiva o desenvolvimento nacional, uma vez que a
empresa tem uma política específica para isto. Lembrou que nenhuma empresa
estrangeira jamais comprou uma plataforma no país.
A senadora Vanessa Grazziotin
questionou se há a possibilidade de a participação governamental na partilha
ficar abaixo de 75% do óleo excedente, e indagou qual a média internacional
desse tipo de contrato. Metri reafirmou que, na ocorrência do leilão, pode
chegar ao mínimo previsto de 41,65%, mas que sua expectativa, diante da baixa
concorrência já constatada, deve ficar em torno de 45%.
Citou dados compilados pela
Agência Nacional de Petróleo e Gás Natural (ANP) em 2001, segundo os quais a
média pedida pelos países exportadores em óleo equivalente, nos contratos de
partilha, é de 65%. Já nos países importadores que possuem reservas de
petróleo, essa média é de 45%. Venezuela, Colômbia e Noruega, por sua vez,
exigem um retorno próximo a 90%.
Já Fernando Siqueira lembrou que
o edital prevê percentuais ainda menores. Em caso de produção abaixo de quatro
mil barris por dia, com o preço menor que US$ 60 por barril, a União abre mão
de 31,72% do que deveria ganhar para a empresa exploradora.
200 milhas
Metri lembrou ainda que os
Estados Unidos não são signatários da Convenção Internacional de Direitos do
Mar, que prevê uma zona econômica exclusiva das águas situadas a até 200 milhas
da costa. A área aceita pelos Estados Unidos é de 12 milhas, o que colocaria as
reservas do pré-sal em águas internacionais. Para ele, a forma de garantir a
soberania dos campos de petróleo do pré-sal é uma discussão que não pode ser
esquecida.
O senador Roberto Requião, que
presidiu toda a audiência pública, disse ter considerado “persecutória, mas
interessante” a tese manifestada pelo diretor da Federação Única dos
Petroleiros (FUP), Abílio Tozzini, de que as empresas americanas não
participaram do leilão porque não aceitam a soberania brasileira sobre as 200
milhas de águas territoriais. O sindicalista da FUP, que falou na audiência
quando a palavra foi facultada aos demais participantes, ainda lamentou que o
governo tenha incentivado o consumo de derivados, ao subsidiar a indústria
automobilística, mas não tenha investido em atividades de refino de petróleo na
mesma proporção.
Foto: Lia de Paula/Agência Senado
Fonte: MAB e Agência Senado
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