por Gabriel Brito e Valéria Nader
Após a volta à tona dos carteis
empresariais (desnudados pela justiça europeia há quase cinco anos) em torno
das licitações e leilões do metrô paulista, a histeria e hipocrisia social
estão mais latentes do que nunca. A grita contra o PT, diante da possibilidade de o julgamento do
mensalão voltar à estaca zero (até o fechamento deste texto ainda não havia
saído o resultado final), decorre, em grande maioria, dos setores sobre os
quais pesam, já há anos, as denúncias de escandalosos desvios de recursos públicos,
tradição que adquiriu novo patamar após os anos de privataria tucana.
Enquanto isso, São Paulo agoniza em sua falta de
mobilidade. O vasto esquema de propinas alavancado pelas empresas participantes
das licitações do metrô implicou em valores seriam suficientes pra aliviar o
sufoco paulista, que a esta altura poderia ter valiosos quilômetros extras de
linha férrea - como apontou a própria mídia corporativa
Em entrevista ao Correio da
Cidadania, o deputado estadual Carlos Giannazi explica como o governo Alckmin
tenta agora fazer uma investigação fajuta na Assembleia, ao mesmo tempo em que
bloqueia todo e qualquer requerimento de investigações e convocações mais
profundas, neste e em outros temas, nos quais as suspeitas decorrem da mesma
lógica.
“Não conseguimos instalar a CPI
do metrô, da CPTM, da Dersa e tantas outras estatais, além da educação etc.
Essa tem sido a prática do PSDB em São Paulo: obstruir qualquer tipo de
investigação, seja nas comissões permanentes, seja através da instalação de
CPIs pra investigar qualquer instância governamental. É um governo que não
fiscaliza empresas, pelo contrário, está a serviço delas”, explica o deputado.
A entrevista completa com Carlos
Giannazi pode ser lida a seguir.
Correio da Cidadania: As denúncias do propinoduto tucano no metrô já
tinham circulado em anos anteriores. Por que o cartel permaneceu operando por
tanto tempo, quando já se sabia que o processo estava avançado na Justiça
européia, e o escândalo só veio à tona agora?
Carlos Giannazi: Primeiro porque não houve investigação. Não houve
empenho, principalmente, da Assembleia Legislativa de São Paulo, em investigar.
Uma Assembleia Legislativa controlada pelo PSDB há quase 20 anos, embora já
tenhamos feito muitas denúncias em relação à corrupção, na CPTM e no metrô.
Como o governo tem maioria, nossas denúncias nunca foram investigadas.
Não conseguimos instalar a CPI do
metrô, da CPTM, da Dersa e tantas outras estatais, além da educação etc. Essa
tem sido a prática do PSDB em São Paulo: obstruir qualquer tipo de
investigação, seja nas comissões permanentes, seja através da instalação de
CPIs pra investigar qualquer instância governamental.
Correio da Cidadania: Dessa forma, seria praticamente certo que essa
mesma cartelização tenha se dado nas licitações da expansão do metrô e suas
novas linhas (4 e 5)?
Carlos Giannazi: Tudo indica que sim. É uma prática de todas essas
empresas, como mostram as denúncias. E após essas denúncias, tudo nos leva a
crer que houve a reprodução da mesma prática nas licitações das novas linhas.
Correio da Cidadania: Você faria relação entre esse cartel e o recente
acidente na linha vermelha, com um descarrilamento - o que, de acordo com os
metroviários, pode ter decorrido da falta de critérios técnicos para a compra
de peças e materiais mais adequados ao tipo de trilho que temos aqui?
Carlos Giannazi: Sim. Nesse processo de terceirização de
mão-de-obra, de compras etc. que vem acontecendo no metrô, coloca-se em risco a
própria prestação de serviço. Há linhas de metrô que foram construídas através
das PPPs (Parcerias Público-Privadas). Quem opera o serviço são as próprias
empresas privadas, não mais o Metrô, e tudo isso coloca em risco a segurança e
a vida da população, porque não se tem controle sobre tais empresas. Não há
fiscalização sobre a prestação de serviço e muito menos sobre a qualidade do
material utilizado na construção, na reprodução de peças. Enfim, essa é a
situação.
Correio da Cidadania: São muitos os escândalos que têm confrontado os
governos tucanos nos últimos anos (agora mesmo se viu uma última notícia de que
AES Eletropaulo compra energia da AES Tietê – AES Corporation, sediada nos
Estados Unidos, por um valor 550% mais caro do que seu custo normal, a exemplo
do cobrado pela Eletrobras). Como vê a postura de Alckmin diante de tantos
escândalos, mostrando, por exemplo, indignação com a delação do executivo da
Siemens?
Carlos Giannazi: O governo Alckmin é um governo a serviço de tais
empresas. É um governo que compactua com as concessionárias dos pedágios e
tantas outras. É um governo a serviço das empresas. Assim, é um governo que não
fiscaliza e não cobra as empresas que prestam serviço ao Estado. E a Assembleia
Legislativa, controlada pelo governo, tem parte nisso também. Eu vejo dessa
maneira: um governo que não fiscaliza empresas, pelo contrário, está a serviço
delas. Agências reguladoras no nosso estado não controlam nada, como, por
exemplo, a Arsesp (Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São
Paulo). É uma situação muito constrangedora, na qual o setor privado manda no
Estado.
Correio da Cidadania: E você acredita que tais cartéis também tenham se
formado em outras áreas da administração pública, como começa a pipocar na
imprensa nos últimos dias?
Carlos Giannazi: Eu acho que sim, mas como provar isso se a
Assembleia Legislativa é impedida de investigar? Recebemos muitas denúncias,
indícios, porém, quando procuramos investigar, através da instalação de uma
CPI, ou convocando secretário, presidentes das estatais, ou mesmo empresas pra
deporem, os requerimentos são todos obstruídos pela base do governo. O governo
não deixa a Assembleia Legislativa investigar.
Correio da Cidadania: Mas, neste caso, não é de se crer que as
investigações possam ser levadas adiante de forma mais independente e descolada
do governismo, chegando a algum bom resultado?
Carlos Giannazi: Com certeza. Estamos tentando instalar a CPI há
vários dias, mas não conseguimos as assinaturas, porque a base do governo não
assina. A base do governo é orientada a não assinar. O governador Alckmin não
quer uma investigação profunda. Ele criou uma comissão com vários órgãos da própria
secretaria, mas é uma comissão chapa branca, que não investigará nada com
profundidade.
por Gabriel Brito e Valéria Nader
Correio da Cidadania: Essa falta de investigação poderia se combinar
com um processo semelhante na Câmara dos Vereadores de São Paulo, em relação à
CPI dos transportes que por lá corre?
Carlos Giannazi: Primeiro que essa CPI da câmara municipal é chapa
branca, governamental, não vai investigar nada. É uma CPI do PT, que nasceu
morta, não investiga nada nem ninguém. Aqui na Assembleia, o pedido que fizemos
era pra realmente investigar o governo. Além de todas as denúncias que já são
investigadas pelo MP estadual, MP federal, justiça suíça, CADE...
Correio da Cidadania: Um conluio silencioso entre PT e PSDB pela
impunidade geral?
Carlos Giannazi: Acredito nisso. PT e PSDB são duas faces da mesma
moeda. Em caso de necessidade, se unem a fim de preservarem seus interesses.
Correio da Cidadania: Finalmente, o escândalo poderá, a seu ver,
alterar os rumos das licitações, antigas e futuras, levando, por exemplo, a que
se reveja a política de entregar a administração da expansão do metrô a
consórcios privados?
Carlos Giannazi: Acho que sim. Se houver uma profunda investigação,
certamente o governo terá de rever e repensar todos esses procedimentos
privatizantes, além da terceirização de uma área importante do transporte
público, como é o metrô. Temos muitos contatos com os metroviários e o
sindicato, e vemos que a situação é grave. Cada vez que um setor é privatizado,
vemos cair a qualidade do serviço, do material utilizado etc. A população paga
um preço muito caro, como já vimos esse ano, em relação a sua vida e segurança.
Valéria Nader, jornalista e economista, é editora do Correio da
Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.
Fonte: Correio da cidadania.
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