Os brasileiros e brasileiras têm o direito de saber como votam os parlamentares. E a mídia do país tem o dever de mostrar. Se não o faz, é porque tem interesse em desinformar
Por Celso Vicenzi, na Adital
Virou clichê dizer que “todos os
políticos e partidos são iguais”. É essa também a impressão de uma grande
parcela de cidadãos que aderiu às manifestações em todo o país. Para chegar a
essa quase-certeza (ou certeza, para os mais convictos), houve a colaboração
intensiva da mídia no dia a dia da cobertura política. É verdade que boa parte
dos políticos tem contribuído para que essa percepção prevaleça. Mas esse
sentimento quase unânime foi também habilmente construído pelos meios de
comunicação. Pura e simplesmente por omissão, por sonegar informação ao leitor,
ao radiouvinte, ao telespectador, ao internauta.
Não interessa aos donos da mídia
dizer “quem é quem” no cenário político nacional, estadual e municipal. Por
isso, com raríssimas exceções, a cobertura de votações importantes costuma
trazer apenas o resultado, sem mencionar claramente como votaram os partidos,
os vereadores, os deputados e os senadores. Pode-se alegar que, nos veículos
impressos ou na TV, não há espaço e tempo para tanto detalhamento. Dependendo
da importância do que está em votação, por que não? Em que manual está escrito
que não pode? Depende de que tipo de jornalismo se queira fazer. Na mídia
impressa, certamente há espaço–que não ocupa mais do que um parágrafo– para
indicar pelo menos o voto dos partidos. Idem nas TVs e rádios. São informações
que não deveriam ser omitidas, sob pena de a população nunca saber como votam
os seus representantes nas questões mais essenciais. Quem tem feito esse papel,
com as limitações evidentes de alcance, tem sido as redes sociais.
A diferença de posições
ideológicas entre os partidos, apesar dos pesares, fica evidente, por exemplo,
no caso recente da votação de uma Moção de Repúdio à espionagem norte-americana
que acessou bilhões de emails, telefonemas e dados de empresas e cidadãos
brasileiros, além do governo. A Moção foi apresentada pelo deputado José
Guimarães (PT) e aprovada por 292 votos. No entanto, 86 deputados votaram
contra e 12 se abstiveram de aprovar um documento que se posiciona em favor da
soberania brasileira e pede uma solução internacional para a violação do
direito à privacidade e do sigilo que envolve as relações entre empresas e
países. Quem votou “sim” expressou também “concordância com as iniciativas
destinadas a criar uma agência multilateral, no âmbito do sistema das Nações
Unidas, para gerir e regulamentar a rede mundial de computadores, poderoso
instrumento de uso compartilhado da humanidade”. E externou, ainda, “apreensão
com a segurança do cidadão norte-americano Edward Snowden, que está refugiado,
há dias, no aeroporto de Moscou”.
Certamente há razões para tantos
parlamentares manifestarem-se contrários ou absterem-se de apoiar uma moção
contrária à violação das leis internacionais, que o governo brasileiro –e
outras nações– classificaram como muito grave. O que importa, no caso, não é
discutir o mérito. Mas observar que os partidos identificados mais à esquerda
votaram unânimes pela aprovação. Quando se identificam os votos, o eleitor tem
a chance de saber quem de fato o representa.
Neste caso, dos partidos maiores,
votaram unânimes pela Moção o PCdoB (11 votos), PDT (24 votos), PT (70 votos),
PPS (9 votos), PRB (9 votos) e PV (8 votos). Foram acompanhados pelo voto
uniforme de partidos menores como PEN (2 votos), PHS (1), PSL (1), Psol (2),
PTdoB (2) e o voto do catarinense Jorge Boeira (sem partido). Votaram contra:
DEM (16 dos 20 votos), PMDB (11 contra e uma abstenção, de um total de 64
votos), PMN (2 contra em 3 votos), PP (17 contra em 24 votos), PR (4 contra e
uma abstenção, em 24 votos), PRP (um contra e um a favor), PSB (2 contra e uma
abstenção, em 21 votos), PSC (8 contra em 10 votos), PSD (20 contra em 32
votos), PSDB (3 contra e 10 abstenções) e PTB (2 contra em 13 votos).
Se houvesse uma prestação de
contas rotineira, certamente seria possível que uma parcela cada vez mais
significativa da população compreendesse que, mesmo numa época em que as cores
partidárias perderam muito da sua autenticidade programática, é possível, sim,
perceber diferenças muito claras entre os partidos e os parlamentares.
Os brasileiros e brasileiras têm
o direito de saber como votam os parlamentares. E a mídia do país tem o dever
de mostrar. Se não o faz, é porque tem interesse em desinformar. E impedir que
o cidadão identifique, com mais clareza, quem de fato o representa.
Fonte: site revista forum foto Gustavo Lima/ Agência Câmara dos Deputados
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