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sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Uruguai Pepe Mujica sanciona lei de prazos e despenaliza o aborto


Lei foi criticada pelo movimento de mulheres pelas restrições e atacada pelos conservadores que não querem nenhuma concessão aos direitos e liberdades femininas

O presidente José Pepe Mujica sancionou lei aprovada pelo parlamento uruguaio descriminalizando o aborto até a 12ª semana de gestação.

A decisão faz do Uruguai o segundo país da América Latina a mudar a legislação nesse sentido. O primeiro foi Cuba, após a Revolução de 1959.

Em alguns países como o México, uma verdadeira batalha judicial resultou em decisão semelhante, mas válida apenas para a capital, Cidade do México. Buenos Aires, na Argentina, neste momento enfrenta uma onda conservadora, após o legislativo ter seguido o Supremo Tribunal e aprovado a regulamentação para casos de aborto legal, como gravidez resultante de estupro, já reconhecido na lei.

O Uruguai foi o primeiro país da região a liberar divórcio e garantir o direito de voto para mulheres.

A lei uruguaia para o aborto, no entanto, enfrenta críticas do movimento de mulheres. Para ser aprovado na Câmara dos Deputados, o projeto sofreu mudanças forçadas por setores conservadores. Entre os problemas, está o fato de ser uma legalização parcial, apenas para os primeiros meses da gestação, que cria uma série de condicionantes e tira a autonomia das mulheres para decidir.

Lei de Prazos

A chamada Lei sobre Interrupção da Gravidez foi sancionada no dia 22 de outubro pelo presidente Pepe Mujica, após ser aprovada pela Câmara dos Deputados por 50 votos contra 49; e no Senado em 17 de outubro, com 17 votos de um total de 31 senadores. A Frente Ampla, partido do governo, tem maioria na Casa, com 16 membros.

Essa não foi a primeira vez que o Congresso uruguaio aprovou a descriminalização do aborto. Desde 1978, o movimento de mulheres realiza intensa luta por esse direito e dezenas de projetos foram debatidos no Parlamento. Em 2008, uma legislação ainda mais completa que a atual chegou a ser aprovada, mas foi vetada pelo então presidente Tabaré Vázquez, também da Frente Ampla.


Apesar de descriminalizar o aborto até a 12ª semana, três meses, a lei estabelece que para ter acesso ao procedimento a mulher terá de apresentar e justificar suas intenções, passar por entrevista com três profissionais, que a “conscientizarão dos riscos, dos programas nacionais de apoio à maternidade e da possibilidade de adoção”; e ainda passar por um período de 5 dias de “reflexão” até poder de fato ter acesso à interrupção da gestação.

Essas condicionantes devem ser dispensadas quando a gravidez for resultado de estupro, gerar grave risco para a saúde da mulher ou quando houver má-formação do feto incompatível com a vida fora do útero. Nestes casos, fica estabelecido o prazo de prazo de 14 semanas de gestação.

As regras valem para o sistema público e privado de saúde.

Reação do movimento de mulheres



Desde que foi aprovada na Câmara dos Deputados, em setembro, o movimento de mulheres tem procurado esclarecer que, desta forma, a lei não resolve integralmente o problema do aborto ilegal, clandestino e de risco.

Para Télam Alejandra López, codiretora da ONG uruguaia Mulher e Saúde, o problema é que a lei “não despenaliza o aborto, porque o mantém como delito no Código Penal”.

“O Uruguai optou por aprovar uma lei confusa e retrógrada que mantém o crime e, portanto, a sanção jurídica e moral sobre as mulheres que abortam. A aplicação da pena só é suspensa se a mulher que quer abortar cumprir com uma série de requisitos”, declarou Lilian Abracisnkas, também da Mulher e Saúde (sigla MYSU). As mulheres que forem denunciadas por abortos fora dos prazos continuarão cometendo crime e podem ser denunciadas.

Vale lembrar que o período para reflexão e a tal “conscientização dos riscos”, são iniciativas de cunho puramente moral que, na prática, servem para questionar a decisão da mulher, pressioná-la e atormentá-la. Para mudar sua decisão. Medidas nesse sentido são defendidas por setores religiosos, contrários aos direitos das mulheres, em diversos países onde o aborto já é legalizado, como os EUA.

Reação conservadora

Mesmo com todas essas características, os setores conservadores se levantaram contra a lei.

A hierarquia da Igreja Católica chegou a anunciar publicamente, no dia seguinte da aprovação pelo Senado, que “vai excomungar todos os uruguaios que fizeram campanha em favor da descriminalização do aborto, medida aprovada nesta semana pelo Congresso do país” (Opera Mundi).

O mesmo foi feito em 2008 e acabou fazendo com que o presidente Tabaré Vazquez vetasse o direito das mulheres. Dessa vez, o presidente Pepe Mujica declarou que autorizar uma lei que legaliza o aborto “é mais inteligente que proibi-lo”.

A Igreja defende a excomunhão para manter em vigor o Código Penal de 1938, que prevê pena de prisão para a mulher que fizer um aborto e a quem colaborar com ela.

Um avanço, mesmo que restrito

Apesar das críticas e dos problemas evidentes que existem na lei, para as mulheres dos demais países da América Latina, fica a expectativa de uma luta que resulte numa efetivação de seus direitos em toda a região.

Inclusive porque na maioria deles, como no Brasil, a luta e o debate sobre a legalização do aborto não avança, justamente pela pressão dos setores religiosos, principalmente, a hierarquia da Igreja Católica.

Prevalece uma nuvem de fumaça moral que impede enxergar a realidade do aborto, um problema de saúde pública e não de moral, que atinge milhões de mulheres e não pode ser resolvido através da criminalização.

Afinal, como destacou a professora e pesquisadora da UnB e do Instituto Anis de Bioética, Débora Diniz, “Mulheres que, por razões filosóficas ou religiosas, se creem contrárias ao aborto serão livres para professar suas crenças. O que o Estado uruguaio agora protegerá é o direito das outras mulheres a fazerem suas escolhas livremente”.

A visão religiosa desse problema, que leva a hierarquia católica a defender que um pecado diante da Igreja, seja também crime diante do Estado, é absurda para um Estado que se denomina laico e uma afronta permanente aos direitos democráticos das mulheres.

No Uruguai, uma pesquisa da consultoria Cifra indica que 52% dos uruguaios apoiam a lei de despenalização do aborto, enquanto 34% se manifestaram contrários.

fonte: site PCO

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