"O PSDB jogou as toalhas que tinha na busca de um atalho para alcançar espaços de poder político negado ao partido pelo voto popular"
Por Renato Simões
No próximo dia 10 de abril, por uma decisão perigosa adotada por apenas 4 votos a 3 no Tribunal Regional Eleitoral, Campinas terá – de forma tristemente inédita – a primeira eleição indireta de sua história.
A Câmara Municipal de Campinas escolherá, pelo voto indireto de seus membros, o candidato que completará o que vem sendo chamado pela mídia de ‘mandato-tampão’ de Prefeito, em virtude da cassação pela mesma Câmara do prefeito Hélio de Oliveira Santos (PDT) e de seu sucessor, Demétrio Vilagra (PT). Em jogo, quem comandará a cidade no processo eleitoral de 2012, o legítimo, o de outubro, em eleições diretas, como candidato à reeleição, confortavelmente instalado no 4º andar do Palácio dos Jequitibás, no timão dos 3,5 bilhões de reais do orçamento municipal e todas as relações políticas e econômicas propiciadas pelo cargo.
Esquema criminoso
Se a cassação do prefeito Hélio aconteceu num contexto de farta comprovação de um esquema de corrupção operando em sua Administração sob comando da primeira-dama e de seus principais secretários, a cassação subsequente do prefeito Demétrio foi uma farsa do começo ao fim, associando-o de forma leviana a um esquema criminoso de que passou longe. A Câmara Municipal de Campinas, associada em sua maioria esmagadora ao Prefeito cassado por quase sete anos, entregou ao Ministério Público a cabeça do prefeito petista para ver-se livre das investigações que pesam contra os vereadores e manter perante a população a imagem de impoluta zeladora da moral e dos bons costumes.
Tucanado em baixa
Como pano de fundo de todo o processo, um cálculo arriscado moveu o principal agente deste processo, o PSDB. Sem vencer eleições em Campinas desde 1992, quando foi eleito José Roberto Magalhães Teixeira com mais votos que a soma de todos os seus adversários, o PSDB jogou as toalhas que tinha na busca de um atalho para alcançar espaços de poder político negado ao partido pelo voto popular. Monitorado de perto pelo Palácio dos Bandeirantes, o PSDB local decidiu deixar a primeira divisão da política campineira para voltar a integrar o governo municipal de Campinas. Pela primeira vez desde sua fundação, não terá candidato próprio às eleições majoritárias em Campinas, mesmo erro cometido pelo seu principal adversário, o PT, em 2008, para contentar-se em ser coadjuvante numa composição conservadora que lhe assegure nacos de sobrevivência política. Espero que o resultado seja o mesmo: com o PT, não funcionou!
Com a rejeição consolidada de sua principal liderança, o deputado federal Carlos Sampaio, e o baixíssimo desempenho eleitoral da legenda e
“O PSDB jogou as toalhas que tinha na busca de um atalho para alcançar espaços de poder político negado ao partido pelo voto popular”
de outros nomes (como a deputada estadual Célia Leão, o Secretário Jurandir Fernandes e o vereador Artur Orsi) em pesquisas eleitorais patrocinadas pela cúpula tucana, sobrou ao PSDB local curvar-se ao Governador e aceitar a vaga de vice na chapa do deputado federal Jonas Donizete (PSB), egresso ele próprio do ninho tucano e empenhado membro da base governista de Alckmin e Serra na ALESP quando deputado estadual.
Alianças
Com este objetivo, o PSB de Jonas Donizete não relutou em apoiar com seus votos na Câmara Municipal a cassação do prefeito Demétrio. Contra ele, se compuseram o PSDB e os Partidos que pleiteiam lançar candidatos às eleições de outubro e não queriam, com certeza, um governo de transição dirigido por um petista. PSB e PMDB, dois parceiros nacionais de primeira grandeza do PT nacional, com seus nove votos, além do PDT, este controlado pelo Presidente da Câmara e atual prefeito interino, ajudaram a selar a cassação de Demétrio. O PT, enfraquecido, não teria fôlego para recompor-se. Essa a fragilidade das alianças nacionais do PT em São Paulo: PSB, PMDB e PDT são legendas associadas ao governo do Estado de São Paulo e constituem-se como potenciais aliados do PSDB. Algo pra resolver no futuro…
A fragilidade do relatório final da Comissão Processante contra o Prefeito Demétrio, uma peça grotesca que consumiu meses de holofotes e dinheiro público desperdiçados com a Câmara Municipal, apenas serviu para corroborar a análise de que, mais importante que os fatos e as provas, prevaleceram os interesses políticos do PSDB e dos partidos em enfraquecer o PT, para o que concorreram efetivamente os ânimos midiáticos do Ministério Público e do Judiciário em Campinas, sempre presentes quando necessários nos momentos decisivos.
Jejum tucano
Pois bem, ocorre que o PSDB campineiro resolveu inovar. Apalavrado com o PSB para a disputa eleitoral de outubro, os tucanos rapidamente se compuseram com outro egresso de suas fileiras, o prefeito interino Pedro Serafim (PDT) para as eleições indiretas de 10 de abril. Faminto depois de vinte anos de jejum, foi o vereador tucano autor das denúncias que levaram à cassação do prefeito Demétrio o premiado para compor o primeiro escalão de Pedro Serafim. Em pouco tempo, Serafim desmontou também a aliança PSB/PMDB para as indiretas, integrando os vereadores peemedebistas ao governo até a cristianização da candidatura do Partido às indiretas, Romeu Santini, e quebrando o bloco que resiste à sua eleição biônica.
Para tanto, a caneta e a contemplação de interesses importantes das elites locais selaram o apoio da maioria dos vereadores da ética Câmara Municipal ao prefeito interino. Sem que o Ministério Público ou o Judiciário abra a boca para nada em Campinas, o prefeito interino vai nomeando vereadores e assessores nos cargos em comissão da Administração consolidando sua maioria eleitoral. E fechando acordos com os interesses imobiliários e de empresas terceirizadas que sempre ajudam na hora de convencer seletos grupos de eleitores. Como a Justiça Eleitoral delegou à própria Câmara a definição da regra do jogo das indiretas, não há quem fiscalize raposas, galinheiros e afins envolvidos na disputa até 10 de abril.
Distanciamento
Em boa hora, o PT redimiu-se parcialmente de seus erros do passado, distanciando-se do prefeito Hélio no processo de sua cassação, lutando pelas eleições diretas até a polêmica decisão judicial pelas indiretas e denunciando a eleição indireta como ilegítima, tanto quanto consideramos ilegítima a cassação do Prefeito Demétrio. Por decisão praticamente unânime de seu Diretório Municipal, o PT não participará do pleito indireto.
A lamentar o fato de que a crise política que arrastou Campinas para a lama e as páginas policiais em 2012 tenha esse lamentável desfecho, que pode – se consumado – constituir-se em jurisprudência para casos similares. Na ditadura, Campinas não era capital do Estado nem área de segurança nacional, como a nossa vizinha Paulínia, e portanto não conviveu com eleições indiretas de Prefeito. A comemorar, o fato de que não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe: outubro vem aí, e o povo de Campinas retomará a chance de mudar de rumo e melhorar a qualidade da política e da vida em nossa cidade.
*Renato Simões é secretário Nacional de Movimentos Populares e Políticas Setoriais do PT e membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe)
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