“Eu dentro de minha concepção do porquê viver, acho que a gente vive para transformar alguma coisa. Quer dizer, ter uma atuação num processo de transformação da vida”
Com estas palavras simples Santo nos manifestou o sentido de sua vida e morte.
Santo, homem de poucos discursos e constante atuação, começou sua participação na Legião de Maria na Igreja Católica de Viradouro interior de São Paulo. Foi na igreja e no sindicato rural que despertou o anseio de justiça que o animou a dizer o primeiro “não” ao negar-se a assinar um documento enganoso do fazendeiro. De homem de confiança se tornou desafeto e sua família foi expulsa da fazenda Guanabara. “Você cuspiu no prato em que comeu” repreendeu-o seu pai.
Por não se conformar com a vida de bóia-fria veio para São Paulo em 1962. Começou a trabalhar na metalúrgica Metal Leve em Santo Amaro.
Santo começou sua participação na Legião de Maria passando para as Comunidades de Base e Pastoral Operária. Seu coração era sensível a todos os anseios de um povo explorado e carente por causa das condições de trabalho na fábrica e de moradia no bairro Jardim Santa Teresa, periferia de São Paulo.
O compromisso de uma fé autêntica o levou, junto com as pessoas das comunidades e grupos de Pastoral Operária onde atuava: Santa Margarida, Vila Remo..., a transformar aquela realidade de carências e privações. Conquistaram água encanada, luz, asfalto, transporte coletivo, posto de saúde, escolas; lutaram no movimento Custo de vida contra a carestia....
Nas fábricas, estimulado pela exploração esgotante, lutou por melhores condições de trabalho e repetiu o atrevido “não” do “Operário em Construção” de Vinicius de Morais, passando de operário exemplar a pessoa malvista. Expulso das fábricas sempre voltava nelas, junto com os companheiros da Oposição Sindical para distribuir boletins que incentivavam a lutar: por reposições salariais, melhores condições de trabalho, quarenta horas semanais...
Mas foi no sindicato metalúrgico de São Paulo onde, junto com a Oposição Sindical, travou uma luta constante para expulsar os interventores dos militares no sindicato e fazer dele um instrumento de transformação e melhoria da vida da classe operária.
Participou varias vezes na chapa de oposição, principalmente em 1978 quando o ministro do trabalho Arnaldo Prieto interveio pessoalmente para dar posse, apesar das evidentes fraudes, a uma diretoria que durante décadas serviu tão bem aos patrões.
Foi na greve dos metalúrgicos de São Paulo de 1979 que, na porta da empresa Sylvania, zona sul da cidade de São Paulo, foi assassinado quando já estávamos nos retirando; ele que era o mais pacífico de todos os que participavam da movimentação. Morte desnecessária e covarde pois no piquete havia mais policiais armados que operários desarmados. Com sua morte levou as últimas conseqüências seu compromisso: “Eu dentro de minha concepção do por que viver, acho que a gente vive para transformar alguma coisa”: as condições de vida no bairro e na fábrica através de um sindicato combativo e uma fé comprometida.
Seu exemplo de vida deve nos estimular a lutar, porque as constantes crises do capitalismo procuram, através da flexibilização das leis trabalhistas, arrancar-nos todas as conquistas conseguidas e pelas quais Santo tanto lutou, junto com todos nós.
A prática religiosa de Santo é Fé, compromisso e ação; é esperança porque luta e conquista melhores condições de vida; é amor na ajuda aos vizinhos nos mutirões no bairro, aos companheiros na fábrica promovendo uma consciência de classe explorada. Não é uma fé cômoda, que não arrisca nada nesta terra e espera a salvação individual depois da morte. Não devemos seguir uma religião ou ideologia que nos acomode. A luta é permanente. Não podemos viver de lembranças, pois perderemos o que temos conquistado.
O desafio hoje das pastorais, partidos e grupos políticos de esquerda é saber unir-se, para acabar com a exploração da classe trabalhadora e lutar por um novo sistema socialista que acabe com as desigualdades sociais. Santo sempre teve a capacidade de conviver e unir-se com as pessoas que pensavam diferentes, para atingir objetivos comuns: “transformar a vida”.
Vicente Ruiz Garcia
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